Eu já fui um sonhador assumido. Aliás, acredito que o certo seja dizer que eu sempre tive ideias demais se comparado ao tempo que teria para executá-las. Com o passar dos anos, então, a maturidade me fez fincar de vez o pé no chão e, sim, continuar sonhando o impossível, desde que realizando o alcançável. Meus objetivos nunca foram tão grandes, já que dominar o mundo nunca foi um desejo meu. Soa como algo trabalhoso e perigoso – sem contar na plateia de bilhões que não só assiste, como também julga e possivelmente atrasa o processo. Contudo, de alguma forma estamos sempre à margem de cair na armadilha de acreditar que precisamos conquistar a maior fatia de mundo que pudermos.
Confesso que a primeira vez que trabalhei em uma empresa grande eu não me identifiquei totalmente com a tal missão estampada na parede. Cá entre nós, sempre me pareceu uma intenção exclusiva do dono, algo que ao menos beneficiaria e alegraria muito mais ele do que eu. Sim, sempre estive de acordo com os valores e (na maioria das vezes) com a visão institucional, e por mais que eu gostasse do meu trabalho, tornar-se uma das maiores produtoras disso ou daquilo nunca foi interesse meu. E se eu já pensava assim lá por 2014 ou 2015, tenho certeza de que muitos da geração atual compartilham do mesmo pensamento.
Não quero dominar o mundo. Quero fazer valer a pena estar nele. E só.
Quero fazer meu trabalho da melhor forma possível, alcançar quem precisar ser alcançado, revolucionar uma multidão que talvez para mim se resuma a 50 pessoas, e ser feliz e grato pelo que faço. Em outras palavras, a única pessoa que preciso provar meus méritos e conquistas sou eu mesmo – até porque, no fim das contas, a minha evolução só diz respeito a mim.
Caso não tenha ficado claro, explico melhor. Ser reconhecido como o melhor advogado, médico, empreendedor, jogador de futebol ou seja lá o que for, automaticamente envolve um júri que chegará a um consenso. Por mais especialista que o time seja, se premiado eu sempre me consideraria o melhor profissional X pela visão de meia dúzia de pessoas Y. Não é o todo, nunca foi e nem será – entende? E se eu estiver certo neste ponto, de que me adianta carregar o título de “melhor X do ano”? Quem o valida como 100% verdade? Porque eu tenho certeza que uma multidão discordaria.
Com meia dúzia de troféus na parede e um par de anos desde que decidi parar de participar de concursos e premiações, sempre que tiro o pó da casa eu olho para eles e me pergunto: pra quê? Será que eu realmente fui o melhor daquele ano? Será que algum outro concorrente não tinha um trabalho tão bom quanto e, alterando um único membro do júri, o resultado não seria diferente? Quantos dos outros competidores desistiram, travaram ou se minimizaram por um título que eu recebi e que, sinceramente, só me vale para exibir aos outros, já que hoje eu entendo que ninguém me garante que sou o melhor – justamente porque eu nem quero ser?
Lembro até hoje do meu virar de chave. Durante a visita do júri de uma premiação ao meu estabelecimento de um funcionário só, vários elogios foram tecidos sobre a personalização, dedicação e produção artesanal do despacho dos meus livros país afora. Entretanto, antes mesmo de agradecer com um sorriso, precisei responder como eu faria para escalar a minha produção e não mantê-la restrita a mim.
Assim como a maioria, fui ensinado que precisamos nos destacar; que precisamos atingir a meta e depois dobrá-la; que a conquista só é conquista quando deliberada pelos outros. Então eu não lembro ao certo o que respondi, mas sei exatamente o que eu responderia hoje: “não tenho o intuito de escalar minha produção”. E sorriria. Será que vale um troféu de Mais Sincero do Ano?