Entrou para o rol de pautas do momento a escala 6x1. De um lado, trabalhadores querendo uma vida com mais respiros e folgas onde o necessário não seja apenas o descanso, e sim o viver; Do outro, políticos e empresários bradando que o país não comportaria uma redução de jornada e que, de alguma forma, colapsaria. O que ninguém tem falado, no entanto, é que a maioria deixou de trabalhar na escala 6x1 há anos. De uns tempos pra cá, percebe-se mas não se discute sobre o que resolvi chamar de escala 14x14.
Meu primeiro emprego foi em uma loja de roupas no comércio de rua. A jornada era bem exaustiva, principalmente na época do Natal, e após deixar o serviço no final da tarde de sábado, tudo que eu queria fazer no domingo era descansar. Eu bem que poderia dizer que hoje o cenário é diferente – e de fato, em alguns pontos é –, mas no que diz respeito ao fluxo de demandas e no esgotamento, não considero tão diferente assim.
Isso porque, há alguns anos nasceu uma nova incumbência que, para muitos, é desempenhada após o término da jornada de trabalho principal. Com a chegada das redes sociais, diversos profissionais entenderam que poderiam utilizar o ambiente como vitrine para seus negócios – e toda propaganda custa... Principalmente tempo. Mesmo os mais resistentes, como uma amiga minha de infância, precisaram render-se aos poucos e encarar a criação de conteúdo. Mais do que nunca, a rede social nada mais é do que o novo cartão de visita.
Dito isso, conheço diversos profissionais que trabalham em uma jornada custosa ao longo do dia e que, nos fins de noite ou nos fins de semana, precisam preparar postagens, editar vídeos, elaborar e programar conteúdos para que, ao serem procurados online, apresentem da melhor forma os seus serviços. Aliás, muitos dividem o pessoal do profissional em duas contas nas redes, o que gera mais esforço ainda. E conhecendo muitas dessas pessoas, tenho certeza de que a maioria não só está esgotada, mas também infeliz. Ou seja, trabalhamos todos os dias, de um jeito ou de outro (quando não, em jornada dobrada).
Dizer que é um absurdo receber mensagem no WhatsApp tarde da noite virou demodê. Naturalizamos o que não deveria ser natural, pois tomamos para si a ideia de que se não estamos online, não somos vistos e consumidos – seja como indivíduos, seja como profissionais. O desenrolar da PEC 6x1 é um mistério, mas trouxe à tona a reflexão de que produzimos cada vez mais, ao mesmo passo que sentimos nunca dar a volta em tudo aquilo que precisamos fazer. Sem querer ser saudosista e hipócrita (mas já sendo), onde é que se desliga o cabo da internet?
