Sob as dualidades do Sol em Gêmeos, deixarei a mente voar em torno das duas versões da novela Pantanal. Sou da turma que assistiu a primeira, em 1990. O país foi impactado por aquela trama que inovava na locação, na abordagem da natureza, na dose entre realismo e magia, no ritmo da narrativa e muito mais. Pantanal fez história na televisão. Ainda mais por ser um produto de outra emissora – a Rede Manchete – que não a hegemônica Globo. Depois de décadas de arrependimento por ter recusado a novela antes, eis que a Globo pôs no ar uma nova versão, já com excelente audiência. Comecei a ver, somente para comparar, e não é que fiquei vidrado na novela outra vez?
São insondáveis as razões do sucesso de um produto cultural. Não basta ter dado certo uma vez para que sua reedição volte a agradar – tanto que há remakes fracassados de novelas antes campeãs de audiência. Para começar, o céu de 1990 era bem diferente do céu de 2022, correspondendo a distintos contextos históricos e anseios coletivos. Entre uma novela e outra, a vida se redesenhou com o surgimento da internet. Nossa rotina passou de analógica a digital, nosso tempo se acelerou, ficamos mais apressadinhos e ansiosos. E esse aspecto responde por uma das grandes diferenças entre as duas novelas – o ritmo.
A nova Pantanal não reedita da outra o padrão de longuíssimos clipes e planos contemplativos com revoadas de garças e tuiuiús ou capivaras e jacarés nadando nas águas mansas – dando à natureza um inédito protagonismo. Hoje, a natureza surge em vinhetas mais curtas. Entre tantos estímulos midiáticos, a luta pela audiência acirrou-se, convém não dar chance de o espectador desviar sua atenção. E a trama ficou refém da velocidade de nosso tempo! Afinal, quantos ainda sabem contemplar alguma coisa? A própria natureza aparece mais comedida agora, sem o esplendor selvagem de 1990. Explica-se isso na novela atual: já não existe aquele pantanal de antes, devastado que foi pela face mais predatória do agronegócio.
Diferenças à parte, há também enormes semelhanças nos mapas das duas novelas. Tanto a primeira quanto a segunda versão estrearam, com 32 anos de diferença, quase na mesma data, 27 e 28 de março, respectivamente, com o Sol em Áries e Sagitário como ascendente. A ênfase nesses criativos signos de fogo injeta potência e significado ao que estava por nascer. Também em ambos os céus das duas estreias, Mercúrio estava em Áries, e Marte e Vênus, no inovador Aquário! Ou seja, mesmo remake, a nova versão também soará surpreendente.
Na primeira Pantanal, a Lua estava em Áries, na fase nova, com Marte, o regente, em tensão com Plutão, a indicar contundência e profundidade. E com a novela deu-se a revelação de um Brasil visceral e oculto. Na versão atual, a Lua estava em Aquário, na fase minguante, ao lado de Saturno, também neste signo. É natural, então, que a nova novela seja mais reflexiva e mais crítica acerca de temas como meio ambiente, liberdades individuais e consciência social – típicas pautas aquarianas. Há um tom politicamente correto e didático na trama atual, ausente na primeira versão. Sim, os tempos são outros.
Somente pela memória da primeira versão, acho que os dois personagens tocados pela magia selvagem, Juma virando onça e o Velho do Rio virando sucuri, têm pesos diferentes nas duas tramas. Arrisco dizer que o Velho – já campeão de memes com frases metafísicas – seja mais forte agora que a mulher selvagem. Mas isso é tema para outra crônica.