As outras palavras de Elaine Cavion!
Hoje a coluna apresenta o dicionário particular de Elaine Pasquali Cavion, professora, escritora e funcionária pública. Caxiense, filha de Vilmar Pasquali e Leoni Terezinha Baldasso Pasquali (in memoriam), é casada com o empresário Jean Cavion, e mãe de Enzo. Formada em Letras e Literatura, Especialista em Educação à Distância, atualmente é mestranda em Literatura pela UFRGS. O universo da leitura e o trabalho em projetos para acesso ao livro e formação de leitores tem sido constante em sua vida. Sua trajetória passa pela Secretaria de Cultura, no Programa Permanente de Estímulo à Leitura, e nas ações da Biblioteca Pública Municipal de Caxias do Sul. Também foi Coordenadora do Setor de Pontos de Cultura, Teatro Municipal Pedro Parenti e Diretora de Projetos da Secretaria de Cultura de Caxias do Sul. O desejo de escrever surgiu de forma natural na vida dela, como decorrência de seu conhecimento crítico da Literatura e do anseio em utilizar a palavra como elemento de criação. Elaine tem cinco livros publicados, entre eles O Colecionador de Águas, selecionado para o Catálogo de Bologna, Itália, e publicado também na Espanha e no Líbano. Neste ano lança “Tempo de Navio” e acredita que a literatura para a infância deve ser tratada como um gênero comprometido com o imaginário e a poesia.
A de Atitude: para sustentar a defesa do livro como um bem cultural necessário.
B de Brilho: se o olho não brilhar, não vale a pena.
C de Criação literária: Um comentário que jamais esqueci foi o de uma criança que leu um dos meus livros: “por favor, não pare nunca de inventar histórias como essa.” Sempre penso nisso ao começar escrever.
D de Delicadeza: é preciso ser muito forte para enfrentar as asperezas de certas situações com a devida delicadeza.
E de Letra: que trago tatuada. Inicial do nome do meu filho e do meu. Letra que ocupa tanto espaço em mim, que precisaria de um alfabeto dedicado a ela. Sua forma, no antigo sumério vem do arado, ferramenta de sulcar a terra para o plantio, para fazer brotar as sementes. E não é exatamente isso que faz quem escreve? Escavar profundamente em si, para que as palavras brotem?
F de Família: adoro! É um pacote completo, já está aí quando nascemos. É nela que o mundo nos encontra. A partir dela que vamos aos poucos agregando pessoas e nos constituindo. Meus afetos são o meu mundo, sou grata a eles por estarem sempre me apoiando nas minhas escolhas.
G de Guarda-chuva: é o elemento que costura a história no livro “O Mestre dos Guarda-chuvas”. A cidade de “Chuvópolis” foi deliberadamente inspirada numa Caxias invernal. No entanto, a relação entre os guarda-chuvas e seus donos é igual em todo lugar, talvez por isso a obra esteja alcançando tantos leitores país afora.
H de Histórias: uma fome que a humanidade tem.
I de Imaginário criador: mote do estudo no mestrado que estou iniciando. Acredito na imaginação como força psíquica necessária ao nosso estrato de realidade.
J de Jardim: amo e cuido. Folha nascendo, folha caindo, com flor, sem flor, não importa. Meu olhar tem necessidade de todos os tons de verde que habitam o entorno da minha casa.
K de Kraken: o monstro citado por Jorge Luis Borges, no seu “O livro dos seres imaginários”. Oriundo da mitologia escandinava, trata-se de um dragão imenso que dorme no fundo do mar. Será que ele acordou em 2020 e a gente não se deu conta?
L de Leveza: palavra do território do ar, mas não é qualquer leveza que eu quero, a que desejo é aquela que acontece com impulso, movimento e vontade. A minha é a leveza do pássaro, não da pena.
M de Marina Colasanti: Manoel de Barros e Mia Couto. Marina, com suas heroínas corajosas me inspira a escrever o que as vezes parece indizível; Manoel de Barros, me fala que a matéria da poesia está muito perto; a Mia Couto agradeço por modelar a linguagem numa forma tão bela que chega a doer.
N de Não: palavra necessária, que estou aprendendo a dizer para selecionar o que realmente importa na minha vida. Não, para o que não agrega e não me faz feliz.
O de “O livro dos Abraços”, de Eduardo Galeano: se alguém ainda não sabe por que a arte existe. Deve imediatamente ler esse livro. Pode me pedir emprestado, tenho dois na estante e, se isso quer dizer alguma coisa, certamente é uma declaração de amor.
P de Peixes: meu signo. Água, fluxo e sensibilidade. Capacidade de contornar as pedras, sem precisar ficar batendo de frente com elas. Eu, líquida que sou, escrevi um livro inteiro falando que água é para se colecionar.
Q de Quietude: Preciso dela para acordar as palavras que moram em mim.
R de Resistir: imprescindível no atual momento.
S de Simples: quando não é preciso explicar, traduzir, desenhar, é porque atingiu esse estado em que o essencial se mostra facilmente compreensível. Na arte e na vida, não é nada fácil ser simples.
T de “Tempo de Navio”: livro que estou lançando neste ano e conta a história de um menino que olhando o céu, enxerga entre as nuvens, um navio. Com a escada de corda solta no ar ele sobe ou não? É um convite que faço aos leitores de todas as idades, que se entreguem a esse tempo único, o tempo de sonhar.
U de Umberto Eco e “As confissões de um jovem romancista”: livro que indico a quem deseja começar a escrever. Mas não só, a prosa autobiográfica do autor cativa qualquer leitor que estiver disposto a entender um pouco mais a respeito dos “bastidores” da concepção de suas famosas obras literárias.
V de Violino: instrumento que o meu filho toca. Seis anos atrás esse espécime de madeira veio morar aqui em casa. Vislumbrando as primeiras lições do aprendiz, já me imaginava com tampões de ouvido. Não foi preciso, desde os primeiros momentos fui completamente arrebatada pelo som que inunda minha casa todos os dias.
W de David Bowie: não estranhe, acabo de me rebelar um pouco com o alfabeto (risos). O “D” e “B” já tem seus respectivos verbetes ocupando a lista. Ele, que tem uma playlist exclusiva no meu tocador, o único, o camaleônico, não poderia ficar de fora.
X de Xô: para a falta de generosidade, xô para quem não contribui com algo de bom para a coletividade.
Y de Sym, acabo de inventar essa...
Z de Zoe: nome de uma das cidades que Marco Polo descreve a Kublai Khan, no livro “Cidades Invisíveis” de Italo Calvino, título imprescindível no meu cânone pessoal. Porque afinal, não importa onde a gente vá, querendo ou não, carregamos dentro de nós, aquela que é a cidade da nossa história.