Encontro um amigo e ele me fala com tristeza da juventude perdida. É um melancólico. A memória, mal sabe ele, filtra os acontecimentos, permitindo vir à tona só os que nos deleitam. O tom de voz é carregado pelo desejo de vivenciar de novo o fulgor dos anos adormecidos. Anseia por passear em um reino de suposta felicidade. Persiste em crer neste paraíso irreal. Deixo-lhe a ilusão e medito no quanto compreendemos a existência de forma diversa. Ando enamorado do futuro, de um tempo que talvez eu nem chegue a abraçar. Dirijo os pensamentos para lá, conjecturando sobre as maravilhas ainda não criadas pelos seres humanos. Sou um otimista incorrigível. Fabrico dentro de mim um universo de liberdade, convicto de que chegaremos a limar muitos de nossos preconceitos. E a nos importarmos menos com o olhar do outro, manifestando-nos livremente.
Sonho com o amanhã sem ansiedade alguma, afastando o ímpeto de me deslocar do presente. Busco imaginá-lo como uma catedral sendo construída aos poucos. Alcançaremos uma plenitude maior daqui a trinta, cinquenta anos? Difícil afirmar. Entretanto, temos nas mãos instrumentos eficazes para esculpir com sabedoria os dias que nos esperam. Acredito na palavra progresso, porém, no âmbito interior, da subjetividade. Está em nós a capacidade de corrigir os processos mentais em busca de uma percepção mais clara do que nos cerca. À noite costumo me indagar sobre as ações praticadas, refletindo se magoei alguém, se agi com correção e tomei decisões acertadas. Embora a vida já nasça passada a limpo, sem a possibilidade de fazer um rascunho prévio, reviso inúmeras vezes o que ocupa a minha mente, pois ela é responsável pela criação do mundo ao meu redor.
Ao me aproximar dos jovens, sinto-me seguindo com eles por um caminho aberto, ainda a percorrer. Seu olhar de entusiasmo torna-se meu também. Contabilizo a vida em dias, em afetos partilhados. E aprendi com o poeta Mario Quintana a ter a idade da pessoa com a qual converso, sem a arrogância que a experiência pode nos trazer. Meu rosto se ilumina e sou contaminado pela alegria de ter à frente um imenso território a ser explorado. Gosto da solidez dos troncos maduros. Não deixo, no entanto, de admirar as brotações. O horizonte é minha casa.
Se tivesse um filho, ensiná-lo-ia a amar incondicionalmente todas as instâncias experimentadas. Raras e preciosas. Quiçá únicas nesta imensidão cósmica e desértica. Um minúsculo ponto repleto de mistério, como se um deus, num momento de descuido, soprasse uma poeira mágica, insuflando consciência e vontade de ser.
Sigamos contentes, pondo de lado o lamento e a imobilidade, acolhendo quem se faz presente em nós. O milagre é continuar aqui, com o coração pulsando, alimentados pelo sangue que nos nutre. A existência se abre em busca de mais tempo. Que me seja concedido ardor para o eterno florescimento da alma.