Gilmar Marcílio
No correr do último ano fomos obrigados a rever a maioria dos nossos projetos, solidamente atrelados à realidade. Se antes se estendiam generosamente, acabaram encurtando seu prazo de validade. O hoje passou a ter primazia absoluta. Alguns ainda ousam fazer projeções, mas sabem da grande probabilidade de ver seus intentos naufragarem. Colados no momento, à espera da suspensão desse pesadelo que nos afastou do essencial por nós então ignorado, seguimos claudicantes, mirando quase unicamente o presente. Isso é bem triste, mas também é um convite filosófico para reavaliar o supostamente periférico. A vida é arranjada de forma a nos protege dos abismos. No fundo, sabemos situar-se isso longe da verdade, mas o autoengano é um poderoso aliado na manutenção do equilíbrio emocional. O terreno sobre o qual pisamos nunca se apresentou tão movediço. Estar bem nada garante, pois a alegria pode ser fraturada a qualquer instante. A morte de amigos e parentes até então saudáveis acabou por revelar o óbvio: há poucas garantias e menos ainda estabilidade. Tudo é cristal, vento, linha de seda se esgarçando. Permanecer atento a essa condição inerente ao humano nos devolve a consciência da preciosidade do ar respirado, da boa saúde, do conforto físico. Sempre se ganha e sempre se perde.
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