Gilmar Marcílio
Somos criaturas adaptáveis e o que, num primeiro momento, nos parece insuportável, adquire aspecto de normalidade quando inserido repetidamente no cotidiano. Até a morte das pessoas amadas acaba por se acomodar dentro de nós. Chama-se a isso sobrevivência, uma variação emocional dos princípios darwinistas. Aqui e ali, a vida vai se moldando conforme as circunstâncias. O incontornável volta a ganhar sentido e a realidade colore com outras necessidades o que parecia ter se transmutado em algo doloroso demais. A capacidade de resiliência dos humanos é admirável. Fraturas do corpo e da alma são estados passageiros e na grande maioria das vezes reconfiguramos nossos propósitos para seguir em frente. Mas algumas coisas deixam um gosto amargo se findam ou são suspensas provisoriamente. Ao ser obrigado a buscar uma nova maneira de me relacionar com os outros em consequência da pandemia, o mais difícil para mim foi a ausência das conversas com meus bons amigos. A tecnologia supre parcialmente essa lacuna de forma impensável até recentemente. O que teria sido de nós sem uma videochamada para mitigar a saudade de pais, filhos e todos quantos se distanciaram por puro instinto de proteção e preservação?
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