Uma peça publicitária do Banrisul para este momento de reconstrução do Estado, que começou a veicular esta semana, resgata em boa hora uma canção que é uma preciosidade da música gaúcha e regional. A música estava lá, soterrada pelas quinquilharias do tempo, e poucas coisas são capazes de produzir uma experiência tão mágica do que ser surpreendido inesperadamente por uma música de anos que nos remexe a alma, mas que ficou pra trás, esquecida, obra da falta de tempo que nos afasta das coisas belas – um pecado sem salvação. Eis a proeza da peça publicitária do Banrisul para um tempo de reconstrução. Pegou na veia.
Os versos de Semeadura, composição de Vitor Ramil e José Fogaça para a 10ª Califórnia da Canção Nativa de Uruguaiana, em 1980, em sua versão longínqua e original, chegam na companhia sonora de um teclado e dos acordes de um violão milongueiro e são arrebatadores. Eles traduzem com perfeição o espírito de utopia que reinava naqueles inesquecíveis, necessários e fundamentais Anos 80. A peça publicitária do Banri nos pega distraídos em meio às tarefas, conflitos e responsabilidades do cotidiano e nos arrebata instantaneamente para um tempo de semeadura na cultura, nas vivências e nas utopias, nas metáforas que extraíam o poema e o canto das lides da terra e do campo para construir juntos uma outra realidade. Um tempo de poesia e de coração aberto, afinal de contas, que aos poucos foi sendo substituído por um tempo de resultados.
Preste atenção e pense um pouco quando você ouvir no rádio ou na tevê, por esses dias: “Nós vamos prosseguir, companheiro, medo não há / No rumo certo da estrada, unidos, vamos crescer e andar / Nós vamos repartir, companheiro, o campo e o mar / O pão da vida, meu braço, meu peito feito pra amar / Nós vamos semear, companheiro, no coração / Manhãs e frutos e sonhos pr’um dia acabar com essa escuridão / Nós vamos preparar, companheiro, sem ilusão, um novo tempo em que a paz e a fartura brotem das mãos.”
Uau! Versos apropriados para um tempo de reconstrução. Há um refrão espetacular nesta música, mas que não vai caber discorrer sobre ele em tão pouco espaço. Semeadura nos leva a outra canção de Vitor Ramil. Quando a Câmara de Vereadores de Caxias do Sul decidiu generosamente conceder a este colunista o título de Cidadão Caxiense, pediu-me que escolhesse uma música para me receber em plenário. Uma música única, capaz de sintetizar toda uma trajetória. Escolhi Noite e Dia, com mais versos arrebatadores, e tenho a certeza de que não errei. Isso vai fazer 10 anos agora em julho. Mas será assunto para a crônica oportuna, para recuperar a data.
Por ora, ficam o resgate e a lição da peça publicitária do Banri: não deixemos que o tempo e a dureza dos dias apaguem coisas belas. Será essencial em tempos de reconstrução. E em qualquer tempo.