Sobre índios, temos perto de nós aquela cena clássica e inevitavelmente desconcertante em ruas centrais de Caxias, instalada um dia aqui, outro ali: a mãe sentada com os pequenos indiozinhos, no colo ou na calçada, à espera de um trocado ou ajuda. Alguma reflexão há de se estabelecer, fugaz, confusa ou desorientada, em boa parte dos passantes que topam com a composição real e ao mesmo tempo plástica dessa cena urbana itinerante.
Sobre índios, temos aqui pertinho de nós uma aldeia de caingangues em Farroupilha, a indicar um caminho. Uma aldeia relativamente organizada, uma comunidade, com projetos, trabalho social, uma escola. Caingangues como a mãe e os indiozinhos das ruas de Caxias.
Sobre índios, há uma diversidade de etnias, uma história em nosso país e uma trajetória de líderes indígenas, de episódios emblemáticos, de agressões, de lutas. Há o pioneiro Mário Juruna, eleito deputado, o pataxó Galdino, queimado vivo por um grupo de cinco jovens brasilienses que saíam de uma noitada em 1997, o caiapó Raoni, incansável protetor da floresta. “Minha luta é para proteger a floresta, para que todos possamos viver em paz”, diz Raoni.
Sobre índios, é preciso constatar que 2019 foi terrível. Aliás, o fato principal do ano foram as queimadas descontroladas da Floresta Amazônica. Os recados transmitidos pelo governo federal foram bem entendidos por quem não tem pudor ou embaraço para devastar a floresta com propósitos econômicos. E a floresta é sagrada para os índios, para Raoni, para que “todos possam viver em paz”.
Mas a paz não é tão simples de obter, pois há interesses em jogo, e 2019 foi mesmo terrível. Sobre índios, é preciso divulgar a recente matança de três índios guajajaras de novembro para cá no interior do Maranhão. Um dos atentados foi sábado agora, e produziu duas mortes. A terceira vítima defendia o território indígena contra a exploração ilegal da madeira.
2019 teve ainda as manchas de óleo no oceano, outra modalidade de agressão ao meio ambiente, mas, em contrapartida, popularizou a adolescente sueca Greta Thunberg, 16 anos, na luta contra as mudanças climáticas. Nossas escolas precisam falar mais de Greta com seus alunos.
Sobre índios, temos ainda a música antológica de Renato Russo: “Quem me dera ao menos uma vez / Que o mais simples fosse visto / Como o mais importante / Mas nos deram espelhos e vimos um mundo doente.” Inegavelmente doente.
O futuro não é mais como era antigamente. Hoje, o futuro é mais concreto, individual, voltado a resultados. Antigamente, o futuro era mais dado a devaneios. 2020 bate à porta. O futuro de antigamente era mais generoso, concretamente.