De tempos em tempos, somos abalroados por imagens terríveis, trágicas, mas emblemáticas, com alta capacidade de resolução, como costuma se dizer hoje das imagens capturadas por nossos celulares a todo instante. Imagens que nos traduzem, e a nosso modo de vida, que desemboca, entre outras facetas, em um drama migratório universal, pessoas desesperadas atrás de alguma oportunidade para si e sua família longe do país em que nasceram. Fogem da guerra, da fome, de privações que só elas sabem.
Esta semana nos foi mostrada a imagem do salvadorenho Óscar Martínez e sua filha Valeria, de 11 anos, mortos por afogamento no Rio Bravo, fronteira natural entre os Estados Unidos e o México, quando tentavam ingressar nos EUA. Óscar lutou de braçada por um futuro melhor, para ele, para a pequena Valeria, para sua esposa, que a tudo assistia da margem. Mas perdeu para a força da água e resultou naquela imagem comovente, de pai e filha de bruços na margem do rio, sem vida. O pai lutou. O detalhe da foto, se é que já não basta o poder da foto em sua inteireza, é o frágil corpo da menina por dentro da camiseta do pai, com o braço a envolver seu pescoço. Não há o que falar sobre a foto, a não ser silenciar, fazer a homenagem devida. Talvez apontar algum detalhe e, a partir de uma imagem como essa, reafirmar nosso compromisso com a vida. Compromisso que precisa ser contraposto à indiferença.
Quatro anos atrás, em 2015, havíamos sido abalroados pela foto de Alan, um menino sírio de 3 anos cuja família tentava fugir da guerra. O corpo pequeno sem vida, levado pelas águas até as areias de uma praia da Turquia, foi recolhido cuidadosa e reverenciadamente por um policial daquele país. Os dias passam, a imagem não foi suficiente, vai ficando para trás.
Cada qual com seus problemas, se pensará. Não pode ser assim. Temos nossas questões paroquiais e nacionais, é certo. Mas devemos estar preparados para abrir espaço a situações que nos traduzem como humanos que somos, que se manifestam na margem do Rio Bravo ou em uma praia turca. Temos de ter a percepção de que há questões, acima da distância e da geografia, que precisam ser assumidas por todos. Parar diante delas e reafirmar um compromisso de vida. Nesta aldeia global, não há “nós aqui, eles lá, nós assim, eles assado”. Somos todos nós. A existência e que postura adotar diante da vida nos dizem respeito.
De longe, façamos pelo menos uma pausa para Óscar e Valeria. Ou bem mais do que uma pausa.