Uma decisão do ministro Herman Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), trouxe na última quinta-feira (22) mais um elemento para o Caso Magnabosco, em Caxias do Sul. O magistrado cassou uma liminar que beneficiava a prefeitura de Caxias do Sul, e com isso os credores da indenização pela área onde está o bairro Primeiro de Maio podem voltar a pedir o bloqueio das contas do município para pagamento de um dos precatórios decorrentes do processo.
Com isso, o caso volta ao status em que estava em 2017. Naquele momento, após sucessivas decisões favoráveis aos antigos proprietários da área, a Justiça concedeu aos credores a execução de parte da dívida, e R$ 65 milhões das contas da prefeitura chegaram a ser bloqueados para pagamento. Na época, o município recorreu e conseguiu, no STJ, um efeito suspensivo que possibilitou a liberação dos recursos.
Agora, com a recente decisão, esta medida está revogada por Benjamin, e a cobrança pode voltar a ser feita.
Apesar de, juridicamente, a prefeitura estar novamente ameaçada de um novo bloqueio de recursos, as circunstâncias que envolvem o processo neste momento são diferentes, e a dívida não deve ser executada de imediato.
Esse posicionamento é confirmado pelo advogado Durval Balen, que representa os antigos proprietários da área. O motivo para esta mudança de postura é a possibilidade de uma negociação entre as partes, que está sendo mediada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Em novembro de 2023, a maioria dos ministros acolheu um recurso da prefeitura e entendeu que o caso poderia ser discutido na corte.
Com isso, em abril passado a ministra Carmem Lúcia determinou que os interessados formalizassem a intenção de uma conciliação. Um encontro deve ser marcado nas próximas semanas, e Balen entende que um pedido de execução da dívida neste momento seria inadequado, pois atrapalharia uma possível negociação.
Um acordo é aguardado
– Pela manifestação do município, que por meio do prefeito atual disse que vai ofertar um acordo para resolver pacificamente a questão, nós aguardaremos. Seria uma falta de ética, ao menos antes da formalização de uma proposta, tocar essa questão para a frente. Não é assim que se faz as coisas, e nós acreditamos que poderá haver uma proposta dentro da razoabilidade. Tenho muita esperança que acabe logo – diz o advogado.
Estes valores que agora podem ser executados se referem à chamada “parte incontroversa” da dívida, formada pelos valores decorrentes das sucessivas condenações que o município sofreu nas instâncias que julgaram o caso, e sobre a qual não há dúvida em relação aos cálculos iniciais.
Para este montante já foi emitido um precatório, que é como se chama a requisição de pagamento expedida pela Justiça.
Balen lembra que há ainda a denominada “parte controversa”, um pedaço da indenização cujos cálculos iniciais foram contestados e revisados, mas que também fazem parte do processo e entrarão no cálculo do valor final da dívida.
Em virtude da possibilidade de negociação, ele informa que a defesa não vai encaminhar, neste momento, o pedido de expedição deste segundo precatório. A estimativa é que a soma das duas cobranças atualmente fique acima de R$ 1 bilhão, computando os valores iniciais, juros e correção monetária.
Prefeitura também aposta em negociação
A cassação da liminar que impedia a cobrança não foi uma surpresa para a prefeitura de Caxias do Sul.
De acordo com o procurador-geral do Município, Adriano Tacca, ainda não houve uma intimação sobre a decisão, mas era esperado que a questão fosse analisada cedo ou tarde, pois o STJ já decidiu sobre o mérito do Caso Magnabosco e todas as pendências referentes a ele devem ser resolvidas.
Uma das possibilidades seria pedir uma nova liminar, desta vez no STF, suspendendo a execução do precatório. Essa alternativa, porém, ainda não está na mesa, pois Tacca também entende que a prioridade neste momento é criar um ambiente propício à negociação.
Ele revela que, em breve, deve ser solicitada ao Supremo a marcação da audiência, e por isso o foco está em agilizar a elaboração de uma proposta.
– Vai ter uma proposta pronta. Eu já acertei com o prefeito e ele me deu carta branca sobre até onde a gente pode chegar, e a gente vai apresentar. Como caxiense, eu posso dizer que não vai ser fácil, pois é muito dinheiro, mas cada vez mais se faz necessário sentar e negociar – informa o procurador Adriano Tacca.
ENTENDA O CASO
::: O Caso Magnabosco nasce a partir de um litígio que envolve a área de 57 mil metros quadrados que a família Magnabosco doou, em 1966, para construção da Universidade de Caxias do Sul (UCS). O terreno acabou não sendo utilizado para a finalidade inicial, e acabou ocupado por centenas de moradores 10 anos depois, dando início ao bairro Primeiro de Maio. Desde então, a questão se arrasta na Justiça.
::: Após ter oficialmente devolvido a área aos antigos proprietários, em 1982, o município de Caxias do Sul foi incluído no processo como polo passivo, por supostamente ter colaborado com o processo de invasão, especialmente por ter fornecido infraestrutura para a urbanização da área.
::: Depois de ter sido condenado, o município ingressou com a ação rescisória, solicitando a retirada do polo passivo, em tentativa de não ter de pagar a indenização total. A questão se arrastou por anos no STJ, e em 2023 chegou ao STF.