A abertura de pontos extras de cobrança via sistema free flow, uma possibilidade ventilada na semana passada pelo governador Eduardo Leite, chamou a atenção de lideranças da região. Em geral, as reações são de rejeição e cautela com a nova proposta, especialmente pelo fato de que pedágio é sempre um tema muito sensível aos moradores da Serra.
Para relembrar: em entrevista à Gaúcha Serra, Leite informou que, pela tecnologia envolvida, o sistema permite que outros pontos de cobrança sejam criados no trecho administrado pela concessionária CSG, dividindo a conta com os já existentes e reduzindo os valores gerais pagos pelos motoristas. No entanto, reforçou que uma mudança como essa teria que passar por ampla discussão.
Uma das principais questões lembradas pelas lideranças se refere a um compromisso assumido durante os debates que embasaram a criação do Polo 3 de concessão. A premissa era de que não haveria cobrança entre as grandes áreas urbanas da Serra, evitando a polêmica e o desgaste criado no passado pela existência de uma praça entre Caxias e Farroupilha.
A nova modalidade, mesmo que com valores menores, traz à tona essa memória negativa sobre o tema, e por isso já causa preocupação. A presidente do Conselho Regional de Desenvolvimento da Serra (Corede-Serra), Monica Mattia, admite que as declarações de Leite causaram mal-estar e acredita que podem ser resultado de movimentos de pressão política.
— Foi uma surpresa para todo mundo. A impressão que eu tive é que a região ficou meio nervosa com essa possibilidade. Eu faço uma avaliação no sentido de imaginar que esta manifestação do governador seja decorrente de movimentos ou de pressões de certos segmentos da sociedade. A gente sabe, por exemplo, que o Vale do Caí tem pressionado muito o governo, no sentido de que considera que vai sustentar a duplicação da Serra, e na verdade não é bem isso, pois quem usa a rodovia é o Estado como um todo — aponta Monica.
O uso do free flow como uma resposta às críticas pelos valores cobrados também é uma hipótese considerada pela presidente do Corede. Ainda assim, ela sugere calma, pois há um longo caminho até a efetivação de qualquer mudança:
— A legislação do free flow foi aprovada em dezembro de 2022. A partir daí, o governo encontrou uma alternativa para buscar reduzir a tarifa, até porque existem alguns setores empresariais que também se manifestam achando que a tarifa total ficará muito cara. E aí a possibilidade do free flow é a resposta do governo a essas demandas, dividindo a conta. Mas para isso acontecer, haverá uma caminhada gigante, pois antes são necessários dois anos de registro nas praças. Depois a concessionária tem que apresentar os dados ao Estado, que estruturará uma proposta para ir à consulta e audiência pública antes de se transformar em lei.
Mesmo entre quem apoiou o processo de instalação dos pedágios, a ideia de criação de novas praças não é bem-vinda. É o caso do grupo Mobilização por Caxias (MobiCaxias). O presidente da entidade, Rodrigo Postiglione, também defende a manutenção do modelo previamente acordado com a sociedade.
— Pela análise que fizemos com os membros do Mobi, e o que foi convencionado na época em que apoiamos a concessão de rodovias, é que não teria pedágio entre as cidades de Caxias, Farroupilha, Garibaldi e Bento Gonçalves. Somente nos trechos que haviam sido demarcados previamente. Então, o que for feito fora daquilo que foi acordado, acredito que nós e todas as outras entidades com as quais já falamos sejam contra — aponta Postiglione.
As declarações do governador também tiveram repercussão negativa entre o meio empresarial. Daniel Bampi, presidente da Associação das Entidades Representativas da Classe Empresarial da Serra Gaúcha (CICS Serra), defendeu o cumprimento dos compromissos assumidos, e classificou a discussão como desconfortável e precoce, já que o contrato recentemente começou a ser aplicado:
— Isso não está previsto em contrato, e a gente inicialmente não é favorável a esse formato, porque nas conversas iniciais não se tratava de que acontecesse isso. São necessários estudos, pois a ideia de que vai dividir custos é uma suposição. Como é essa conta e quantos automóveis passam onde estão instaladas as praças de pedágio? A gente ficou de conversar com pessoas da área técnica para ver disso, mas a população, pelo que a gente sente, é contrária a essa situação. Esse é um dos problemas do Brasil, a insegurança jurídica. Mal se começou a cobrar, e já se fala em troca de praças de pedágio. Isso é muito desconfortável.