A sequência de bloqueios de rodovias e outros danos que temos visto neste ano de 2023 na Serra gaúcha pode ser analisada sob vários ângulos. Para mim, um que está cada vez mais evidente é que temos uma infraestrutura, principalmente viária, muito deficiente. Não que isso não fosse sabido, mas as condições climáticas deixaram isso transparente, e agora temos que correr contra o tempo para tentar corrigir esta situação, além de evitar erros do passado.
Não há dúvidas de que os fatos registrados no clima do Brasil em 2023 estão fora da normalidade. Os meteorologistas alertaram que o fenômeno conhecido como Super El Niño traria alterações, mas a frequência e a intensidade do que tem acontecido é surpreendente. Sinal de que as mudanças climáticas apontadas pelos cientistas estão cada vez mais visíveis, e ao que tudo indica, vão continuar presentes nos próximos anos.
Justamente pelo fato de que essas ocorrências extremas cedo ou tarde vão se repetir, é preciso repensar o que temos de estrutura. E aí, alguns improvisos históricos não têm mais cabimento. Não era possível prever que uma enxurrada levaria a ponte que ligava Nova Roma do Sul a Farroupilha, mas ter como principal acesso uma via de mão única, construída há quase 100 anos, já não era razoável, e a cheia só escancarou isso.
E o que o falar da ponte entre Cotiporã e Bento, que nem precisa de uma chuva mais forte para ficar totalmente submersa? A lógica da desatualização também se aplica à BR-116, projetada na década de 1930, e que segue com o mesmo traçado base. Podia ser o que de melhor havia na época, mas está claramente defasada para hoje atender a Região das Hortênsias, uma das mais dinâmicas áreas turísticas do País.
A RS-122 é um pouco mais nova, mas problemas de planejamento e de uso dos recursos também são notados. A via está novamente fechada, e isso não é uma exclusividade causada pelo clima de 2023. Uma rápida pesquisa na internet mostra que, mais ou menos no mesmo ponto, do km 40 ao km 45, entre Farroupilha e São Vendelino, já aconteceram deslizamentos de grande porte em 2019, 2011 e 2000. Em todas essas ocasiões foram feitos remendos, pois uma solução mais definitiva é muito cara.
O dinheiro curto em um Estado cheio de necessidades é, sem dúvida, um problema, pois tudo acaba sendo feito da forma mais barata. No entanto, justamente pela falta de recursos, o ideal seria planejar melhor. Um túnel na Serra e outras ações de grande porte teriam encarecido a RS-122 quando da construção. Mas quanto já foi gasto depois, nos consertos, e quanto ainda será necessário em gambiarras futuras?
Um pouco mais de dinheiro, para fazer uma obra mais caprichada desde o começo, precisa ser visto como investimento no longo prazo. Que os transtornos atuais, com muitos prejuízos sociais e econômicos, sirvam ao menos para essa reflexão. E para as estruturas deficientes que estão aí, as soluções devem ser urgentes, pois as mudanças climáticas trarão ainda mais desafios.