Vivemos tempos de muito falatório e pouca escuta. Rubem Alves falava que nos faltam cursos de escutatória. Fico aqui pensando que falta também um aprendizado sobre escutar-se. Quase nunca sabemos o que se passa dentro de nós. No entanto, diferente de ouvir, escutar é complicado e sutil. Para escutar é necessário que possamos abrir mão da certeza do nosso ponto de vista. Não é que iremos ignorar aquilo que acreditamos e entendemos como correto, mas permitir-se à fala da outra pessoa, para só então tomar uma decisão. Escutar vai além de ouvir o que é dito. Quantas vezes na raiva não escutamos nada. É preciso que possamos silenciar o que se passa em nosso interior. E sim, ir do caminho da raiva que sentimos à necessidade de respirar para entender o que de fato está acontecendo, são os cinco centímetros mais difíceis de se percorrer na face da Terra. Não queremos escutar o outro e logo que paramos para ouvir já queremos colocar nosso ponto de vista. E misturamos o que ele diz com o que queremos dizer. Como se o que o outro diz não fosse digno de ser dito. Sem perceber ocupamos um lugar de difícil acesso. Nos colocamos no topo de nossos entendimentos e julgamentos e assim, acabamos, às vezes, por incitar o rompimento do diálogo. O nome disso é discussão.
Em situações complicadas que nos requerem paciência para entender o que está acontecendo, é preciso que possamos compreender que ao dialogar nunca haverá apenas um lado. Compreender que não somos onipresentes e que há fatos e situações que ocorrem independente de nós, nos faz entender que é preciso estar aberto para a fala do outro.
Às vezes não queremos dialogar porque algo parece nos afrontar. Recuamos, nos colocamos num lugar de não conversa, ou ainda, buscamos incitar a raiva em outras pessoas, para que não enfrentemos sozinhos a situação. Buscamos aliados como se estivéssemos em guerra. E costumamos negar que esta atitude é também agressiva. Quem quer dialogar não quer guerrear. Em tempos de guerra o primeiro valor perdido é o do diálogo.
Às vezes o diálogo nasce de um primeiro silenciamento. É preciso que fiquemos um pouco quietos com nossos próprios pensamentos e afetos para que depois possamos começar a falar. Ficar em silêncio para separar o que é meu do que é do outro. O falar exagerado, querendo a todo custo ser ouvido, é desrespeitoso, principalmente consigo mesmo. Quando se está em paz, a palavra jamais será usada como objeto que possa machucar. Dialogar é acolher o outro em si. É, de modo civilizado, tentar compreender o que suscitou o desentendimento. Dar espaço para compreender o que o outro disse.
Quando nos permitimos escutar, podemos perceber quem realmente somos e como reagimos diante de determinadas situações. O modo como nos colocamos nas conversas fala de quem somos e do que estamos dispostos. Dialogar é compreender-se do tamanho que se tem, nem mais nem menos. Somos nós e nossas experiências e poder entrar em contato com o outro é aprender que nem tudo que imaginamos saber é de todo a única verdade.