Passo Fundo tem a oitava maior taxa de suicídio entre as cidades gaúchas com mais de 50 mil habitantes. Foram 34 casos em 2023, conforme dados da Secretaria Estadual de Saúde (SES).
A taxa de 17,6 casos a cada 100 mil habitantes supera a do Rio Grande do Sul, que terminou o último ano com 14,3 mortes a cada 100 mil.
Também no norte gaúcho, Carazinho tem número ainda mais preocupante: foram 15 mortes por suicídio em 2023, ou 25,5 a cada 100 mil habitantes. O número coloca o município na segunda posição estadual em casos de suicídio, também no recorte por 50 mil habitantes.
As duas cidades fazem parte da 6ª Coordenadoria Regional de Saúde (CRS), que abrange outros 60 municípios.
Um levantamento do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs) traz uma média de todas as cidades gaúchas da região, entre 2018 e 2022. Ao todo, foram 116 suicídios registrados, o que coloca a região na 4ª posição dentre as 18 coordenadorias.
O que está por trás
O problema não tem apenas uma causa. Fatores socioeconômicos e culturais, dependência química, doenças mentais e falta de perspectiva são elementos que contribuem para degradar a saúde psicológica dos pacientes, aponta a psicóloga do Núcleo de Saúde Mental de Passo Fundo, Tatiana Both.
— O mais importante é desenvolver ações preventivas, mostrar que há perspectiva e oportunidade. Mas isso depende de um trabalho de acompanhamento e a demanda é alta. Além dos tratamentos individuais, fazemos ações coletivas com grupos de maior prioridade — disse.
O trabalho coletivo é feito nas escolas, com crianças e adolescentes, com gestantes e puérperas e com dependentes químicos. Já o atendimento individual pode ser buscado pelos pacientes na unidade de saúde de referência.
Em Passo Fundo, 22 psicólogos atendem na rede básica. Segundo Both, foi possível diminuir a fila de espera depois que o município contratou, por licitação, clínicas para auxiliar na demanda do SUS.
Passo Fundo também conta com três Centros de Atenção Psicossocial (Caps), porém, o atendimento é restrito a determinados perfis de pacientes. Eles são encaminhados pelas unidades de saúde, podendo ser:
- Caps Ad Vida, para dependentes de álcool ou drogas;
- Capsi, para crianças e adolescentes;
- Caps II, para tratamento de quadros graves, crônicos e psicóticos.
De onde vem o suporte
Em Carazinho, a enfermeira em saúde mental Helena Roberta da Silva relata que o acolhimento existe para quem procura, porém há falta de atendimento especializado.
— O trabalho de prevenção individual e acompanhamento com grupos de apoio são feitos pelos clínicos gerais, não por psicólogos. Nossa demanda aumentou muito. A atenção básica tem sido guerreira — afirma.
A prefeitura de Carazinho informou que a cidade tem cinco psicólogos para atender a população adulta da cidade, o que inclui os pacientes dos dois Caps.
Conforme Helena, houve um trabalho de aproximação das UBS com o departamento de saúde mental entre 2022 e 2023, o que fez a procura crescer.
— Priorizamos para tratar transtornos moderados a graves porque a pessoa não pode esperar em um caso de tentativa de suicídio, por exemplo. Mas tem pessoas que chegam a esperar um ano na fila para atendimento — acrescenta.
"Telefone não para de tocar"
Voluntária e atual coordenadora do Centro de Valorização da Vida (CVV) de Passo Fundo, Cláudia Lourdes Lentz Chaves Fortunato se dedica ao trabalho há seis anos, desde a fundação da sede no município, em 2018.
— Eu faço o plantão da madrugada e o telefone não para de tocar. As pessoas ligam para dividir tristezas, angústias e até alegrias por não ter para quem contar. Nós não direcionamos nem aconselhamos, apenas fazemos a escuta ativa — relata Cláudia.
O CVV local conta com 13 voluntários, que revezam turnos diariamente, conforme a disponibilidade, para atender aos plantões. O centro recebe ligações de todo o Brasil pelo número gratuito 188, que funciona 24h por dia. Os telefonemas são sigilosos.
— Nosso objetivo não é salvar vidas, nós não somos heróis. Nossa filosofia é fazer as pessoas se ouvirem através de nós, mostrar que a pessoa é capaz de chegar a solução, que ela tem potencial de ela mesma resolver esse problema. O suicídio é um problema que precisa ser falado e nos colocar disponíveis para ouvir o outro, mesmo sem conhecê-lo, é um trabalho de amor — acrescenta.
Qualquer pessoa pode ser voluntária do CVV. Para isso, basta se cadastrar no portal online. O interessado passa por uma seleção e depois por um estágio de 90 dias. Voluntários de Passo Fundo e da região podem fazer os atendimentos de forma remota, uma vez que o centro está sem espaço físico atualmente.
Procure ajuda
Caso você esteja enfrentando alguma situação de sofrimento intenso ou pensando em cometer suicídio, pode buscar ajuda para superar este momento de dor. Lembre-se de que o desamparo e a desesperança são condições que podem ser modificadas e que outras pessoas já enfrentaram circunstâncias semelhantes.
Se não estiver confortável em falar sobre o que sente com alguém de seu círculo próximo, o Centro de Valorização da Vida (CVV) presta serviço voluntário e gratuito de apoio emocional e prevenção do suicídio para todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo e anonimato. O CVV (cvv.org.br) conta com mais de 4 mil voluntários e atende mais de 3 milhões de pessoas anualmente. O serviço funciona 24 horas por dia (inclusive aos feriados), pelo telefone 188, e também atende por e-mail, chat e pessoalmente. São mais de 120 postos de atendimento em todo o Brasil (confira os endereços neste link).
Você também pode buscar atendimento na Unidade Básica de Saúde mais próxima de sua casa, pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), no telefone 192, ou em um dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) do Estado. A lista com os endereços dos CAPS do Rio Grande do Sul está neste link.