Por Nadja Hartmann, jornalista
Em banho-maria desde 2021, quando foi apresentado pela vereadora Eva Lorenzato (PT), o projeto que prevê a criação da Procuradoria Especial da Mulher na Câmara de Passo Fundo pode ainda enfrentar resistências para finalmente sair do papel. Mesmo agora sendo de autoria da Mesa Diretora e diante dos dados alarmantes de violência contra a mulher em Passo Fundo, alguns pronunciamentos de vereadores na sessão da última quarta-feira (27) demonstraram que a iniciativa está longe de ser uma unanimidade.
Anunciado como uma das bandeiras de gestão do presidente Saul Spinelli (PSB), o projeto propõe a criação do órgão que terá entre as atribuições receber, examinar e encaminhar aos órgãos competentes casos de denúncia de violência ou de discriminação contra a mulher. Caberá também à Procuradoria receber denúncias contra assédio moral ou sexual, praticado por agente público do Poder Legislativo.
Porém, segundo o vereador Rodinei Candeia (Republicanos), o projeto tem um claro viés ideológico “só para dar palco para o PT”... Como contraponto, Saul Spinelli lembrou que na Assembleia Legislativa, a Procuradoria é presidida pela deputada Silvana Covatti, do PP.
Discriminatório
Como procurador do Estado, Candeia apresentou uma ampla explicação baseada, segundo ele, em um “olhar técnico” para provar que uma Procuradoria é uma designação que pressupõe representação jurídica, o que não se enquadra no projeto protocolado. Sobre a falta de representação feminina na política, o vereador sugere que as mulheres “peçam voto”. Simples assim...
Além disso, o vereador considera que a criação de um órgão voltado exclusivamente às mulheres é discriminatório, lembrando que o Republicanos teve um caso de assédio contra um homem... Candeia também criticou o fato do projeto determinar por preferência que seja coordenado por uma mulher.
Já o vereador Alberi Grando (MDB) se disse favorável à criação da Procuradoria da Mulher, mas desde que também seja criada a Procuradoria do Idoso e da Infância. A expectativa era que a procuradoria fosse criada ainda em março como forma de marcar o mês da Mulher, mas como foi protocolado só no dia 26 e ainda deve tramitar pelas Comissões, ficou para depois, se aprovado for...
Reenquadramento
Após ter saído da negociação do reajuste salarial sob acusações de insensível e impositivo por parte dos sindicatos, o Executivo municipal surpreendeu a todos ao enviar para a Câmara um projeto que prevê o reenquadramento salarial dos auditores fiscais e dos fiscais da Receita Municipal.
O projeto foi enviado um dia depois da Câmara ter aprovado os 5,5% de reajuste pata todos os demais funcionários, índice que ficou bem abaixo dos 12,51% e 14,4% reivindicados pelo Simpasso e CMP Sindicato. Com o reenquadramento, o salário do auditor-fiscal passa para R$ 6.660 e dos fiscais para R$ 5.550, com um impacto orçamentário de R$ 647 mil em 2024.
Urgência
O Simpasso, que chamou uma paralisação para a próxima quarta-feira (3), reagiu ao projeto se mostrando surpreso, uma vez que o sindicato não foi chamado para tratar do reenquadramento, o que é mais uma demonstração da falta de diálogo do Executivo municipal, segundo os dirigentes sindicais. Protocolado em regime de urgência, o projeto já consta na pauta da sessão do Legislativo desta segunda (1º) com discussão prévia única.
Não resta dúvida que, se tratando do mérito, o reenquadramento não vai ser questionado, mas certamente não vão faltar críticas quanto ao fato de mais um projeto importante ser enviado em regime de urgência. Críticas, aliás, que nem mesmo os vereadores da base estão conseguindo dar conta. Somente neste ano, dos 11 projetos enviados à Câmara pelo Executivo, seis foram em regime de urgência...
Excepcional
Falando em críticas, na sessão desta segunda-feira também não devem faltar críticas ao grande número de contratações temporárias de funcionários, que já virou marca do atual governo. Com o concurso público ainda sem data para acontecer, somente na sessão desta segunda estarão em pauta mais três projetos que autorizam contratações de profissionais para atuar no Centro Pós-Covid, Hospital Dia da Criança e ainda médicos veterinários.
Todos os projetos já receberam parecer favorável das comissões e, diante da necessidade, devem ser aprovados pelo plenário. É mais uma “escolha de Sofia” que vem sendo imposta pelo Executivo aos vereadores. Se rejeitam, podem comprometer serviços à população, mas, ao mesmo tempo, ao aprovar, estão avalizando como rotina algo que deveria ser acionado apenas diante de excepcional interesse público. Pois já há algum tempo, o “excepcional” virou regra...
Apoio de peso
O desenrolar do impasse aumento do ICMS versus corte de incentivos fiscais é um daqueles raros exemplos de que todo mundo sai ganhando, mas ninguém pode cantar vitória. Os empresários ganharam mais 30 dias de sobrevida para evitar o forte impacto na economia. Já o governo conseguiu provar que o seu plano A era melhor que seu plano B e provavelmente consiga emplacar o primeiro (aumento do ICMS) na Assembleia.
Porém, a principal vitória do governo Eduardo Leite foi ter conseguido dividir as entidades empresariais... Aliás, nos últimos dias, o governo ganhou um apoio de peso nos meios empresariais. O presidente da Cotrijal, Nei César Manica, conhecido por escolher criteriosamente as brigas que decide enfrentar, se tornou um dos garoto-propaganda do aumento de 17% para 19% do ICMS, defendido por ele, como o “remédio menos amargo”.
Encruzilhada
...Com grande reconhecimento no meio político, Manica encabeça um movimento que reúne 24 entidades que assinaram um documento solicitando que o governador retirasse o decreto de corte de incentivos que entraria em vigor nesta segunda-feira (1º). Segundo o presidente da Cotrijal, os decretos são mais impactantes aos setores produtivos e irão atingir grande parte da população.
— Estamos em uma encruzilhada. Se formos para o lado A, a população mais vulnerável vai ser atingida com o aumento no custo de alimentos. Se formos para o lado B, este custo vai ser diluído com toda a sociedade. E se seguirmos reto, todos perdem com um Estado menos competitivo — afirmou em entrevista ao Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha.
Manica lembrou que ninguém gosta de aumento de imposto, mas que não é hora de oportunismo e de jogar para a torcida.
— Não é hora de movimento em frente ao Piratini. Isso não leva a nada. É hora de sentar e negociar — disse, se referindo ao ato público chamado pela Federasul para esta segunda-feira.
Avaliação jurídica
Ainda sobre o impasse, a deputada Nadine Anflor (PSDB) esclareceu que o relatório apresentado por ela na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Assembleia em nenhum momento entra no mérito dos decretos do governo, mas sim sobre a legalidade da proposição apresentada que pretendia sustar os decretos.
De acordo com a deputada, o seu parecer contrário como relatora na Comissão foi com base em avaliação jurídica, a partir do entendimento de que um decreto do Executivo não pode ser sustado pelo Legislativo. Em votação no plenário, o recurso apresentado pelo PL foi aprovado com 24 votos favoráveis e 23 contrários, o que foi considerado uma derrota surpreendente do governo Leite na Assembleia.
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