Por Nadja Hartmann, jornalista
Sabe-se que em qualquer negociação, estratégia é tudo. Ganhar tempo deixando a outra parte sem opção é uma tática antiga e que pode ser a chave do sucesso. No caso da negociação entre Executivo e funcionalismo foi determinante. Com a justificativa de que aguardava o índice oficial da inflação para definir o reajuste, o projeto só foi enviado para a Câmara cinco dias antes do prazo para ser votado a tempo de garantir a correção para este ano.
Em função da legislação eleitoral, o projeto deve estar sancionado até 6 de abril. Vale destacar que as negociações com a categoria iniciaram em janeiro e o índice oficial tão aguardado só confirmou a previsão da inflação do período. Portanto, a demora foi estratégica para deixar tanto o funcionalismo como também os vereadores em uma verdadeira “escolha de Sofia”: ou aceitavam os 5,5% ou ficavam sem reajuste este ano.
Entre nada ou um pouco, ficaram com o pouco... Aliás, muito pouco comparado com os 12,51% e 14,4% reivindicados pelo Simpasso e CMP Sindicato. Como a pauta de reivindicações ainda tem 30 itens, os sindicatos estão chamando uma paralisação para a próxima quarta-feira (3), quando a categoria faz um dia inteiro de mobilização no Paço Municipal e se reúne em assembleia.
Entre a cruz e a espada
Se o objetivo do Executivo era confundir, ele também conseguiu... Entre a cruz e a espada, alguns vereadores pediam orientações aos sindicatos sobre como votar. Os vereadores Rodinei Candeia (Republicanos) e Regina Costa (PDT) chegaram a pedir para interromper a sessão para que os partidos pudessem conversar com os dirigentes sindicais, mas não foram atendidos.
Da mesma forma, o presidente Saul Spinelli pediu uma orientação oficial por escrito do Simpasso e CMP sobre a votação, o que também não aconteceu... O pedido foi claramente uma forma de responsabilizar os sindicatos caso a categoria ficasse sem reajuste este ano.
Para a presidente do Simpasso, Bernadete de Matos, jamais um sindicato irá impor um voto ao vereador, já que essa é uma prerrogativa de quem é eleito e só ele deve se responsabilizar por isso. A dirigente lembra que todos os vereadores vinham acompanhando o processo de negociação e que os sindicatos foram surpreendidos com a decisão impositiva do Executivo.
Para a torcida...
Com o limbo pairando no ar, o projeto foi aprovado por 14 a seis, com votos contrários dos vereadores Ada Munaretto e Gleison Consalter (PL), Ernesto dos Santos e Regina Costa (PDT), Eva Lorenzato (PT) e Edson Nascimento (União Brasil), o único vereador da base do governo a votar contra o projeto.
Como a rejeição já era praticamente certa, os vereadores que votaram contrários foram acusados de “jogar para torcida”. Até pode ser, mas certamente é do nome de quem votou a favor dos 5,5% que a torcida vai lembrar. E foi para eles que a categoria literalmente virou às costas logo após a votação...
Apesar disso, foi para baixo da janela do prefeito Pedro Almeida que os funcionários se dirigiram após deixar o plenário para gritar palavras de ordem de protesto, o que demonstra que a estratégia de “embretar” a Câmara pode não ter sido tão bem sucedida assim. Aliás, chamou a atenção que, após o auditório ficar vazio, os vereadores que votaram contrários aos 5,5% para os funcionários da prefeitura e professores municipais, votaram favoráveis ao mesmo reajuste para os funcionários do Legislativo, aprovado por unanimidade...
“Plunct Plact Zum”
Se a relação entre o Executivo e o funcionalismo saiu desgastada da negociação, o mesmo vale para a relação entre o Executivo e Legislativo. O líder da oposição, Rodinei Candeia (Republicanos) chegou a citar a música “Carimbador Maluco”, do Raul Seixas, para protestar contra a forma que os vereadores vem sendo tratados.
Mas quem mais demonstrou irritação com a “escolha de Sofia” imposta aos vereadores foi o presidente da Câmara, Saul Spinelli (PSB). Mesmo não precisando se manifestar e muito menos declarar o seu voto, Saul utilizou a tribuna três vezes durante a sessão para se pronunciar sobre o projeto.
Repetindo várias vezes que “não tem nada contra ninguém”, lembrou dos vários prejuízos sofridos pelo funcionalismo nos últimos anos, como a questão da insalubridade e da terceirização, e ainda deixou um conselho com destinatário certo: “sugiro que visitem mais os espaços públicos e não só os espaços privados”.
Ou seja, se a relação entre o presidente da Câmara e o prefeito Pedro Almeida já não era das mais doces desde que ele deixou a secretaria, parece que agora azedou de vez, deixando a sua permanência no PSB cada vez mais incômoda. Como canta Raul, “plunct plact zum, pode partir sem problema algum”...
A propósito: a condução de Saul Spinelli durante a sessão foi elogiada por vários vereadores. Conseguiu ser duro sem perder a elegância, inclusive, quando teve que assumir o papel de professor e fazer uma chamada nominal para que os vereadores ocupassem os seus lugares, sob pena de ter que suspender a sessão por falta de quórum, o que, aliás, vem acontecendo com cada vez mais frequência. Que feio!
Chegadas e partidas
No mesmo dia que o prefeito Pedro Almeida colhia os louros do anúncio bilionário da Be8 em Passo Fundo, o PT divulgava com “pompa e circunstância” a filiação do médico Júlio Stobbe no partido para compor a majoritária da aliança de centro-esquerda no município, provavelmente ao lado do ex-prefeito Airton Dipp. Mesmo já esperada e anunciada, a notícia criou um fato político de peso no cenário eleitoral...
Os próximos dias devem ser de ainda mais movimentação nos bastidores. A proximidade do fim do prazo para filiações de candidatos pode provocar baixas importantes em pelo menos dois partidos, PL e PSD. Dizem que no partido do prefeito, a atenção dedicada pela cúpula a um determinado candidato está provocando ciumeira e ameaça de rompimento. E falando em PSD, os próximos dias também devem ser de movimentações na aliança de situação, já que a lua de mel com os tucanos anda azedando...
Entre idas e vindas, quem deve fincar bandeira no governo e na coligação é o Podemos, garantindo a cara de “centro-direita” que o PSD tanto busca para fazer frente à aliança PDT-PT e PL-Republicanos.
Entre em contato com a colunista pelo e-mail: nhartmann@upf.br