Uma trajetória que começou em família alçou Francinei Rocha Costa, 38 anos, à posição de campeão brasileiro de sinuca e snooker. O atleta, que é surdo, se sobressaiu entre os 120 competidores que disputavam o XLI Campeonato Brasileiro de Sinuca e Snooker, em Criciúma, no sul catarinense.
Passo-fundense, o profissional começou a treinar aos sete anos. A prática começou na categoria Bola 8, com regras diferentes do formato Six Red - em que Francinei conquistou o título. Acompanhado da esposa e intérprete Fabiane Lima Cigognini, o campeão concedeu entrevista em Libras à GZH Passo Fundo, na sede da Associação Passo-fundense de Sinuca (APS).
Aos 14 anos, Francinei participou da primeira disputa em um campeonato regional, mas acabou na segunda fase. O resultado, ele relembra, foi uma provocação para dedicar-se aos treinos. Então, aos 16, ele conquistou o campeonato gaúcho juvenil.
— Aquela foi a primeira vez que eu fui campeão gaúcho. A vitória dava direito a representar o Estado no nacional, um campeonato ainda maior. Foi desafiador para mim na época, mas importante pelas experiências, vi como outros participantes jogavam, então foi algo muito positivo — conta o jogador, por meio da interpretação de Fabiane.
Barreiras de comunicação
Como atleta surdo, a dificuldade enfrentada por Francinei é na hora da comunicação. Dúvidas sobre faltas cometidas no jogo, por exemplo, precisam ser sanadas com amigos que o auxiliam, uma vez que falta a obrigatoriedade de um intérprete nas partidas. Apesar disso, a vantagem é a concentração:
— Eu tenho muito foco, então o barulho não me atrapalha para jogar, esse é um ponto positivo. Com o passar dos anos, quebrei algumas barreiras em relação à comunicação.
Na sinuca, não existe diferenciação de categoria por deficiência: a competição de alto nível é disputada por todos da mesma forma, tornando-se uma oportunidade para surdos demonstrarem ainda mais a sua autonomia.
— Antigamente na família, o surdo não tinha direito a nada, nem a opinar, já que até o voto era a família que mandava. Hoje, fazemos nossas escolhas em debates públicos e políticos — pontua o atleta, que é professor de Libras no Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS) e doutorando em linguística com foco em Libras, pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Reconhecimento da sinuca
Membro da APS, Francinei reivindica maior reconhecimento à modalidade, que ainda é vista como um esporte informal. Em Passo Fundo, a associação é a única do município e pavimenta o caminho para oficializar cada vez mais o esporte na região e no Brasil.
— A associação existe há 22 anos e hoje temos aqui um campeão brasileiro, que é do interior e isso representa muito para os sócios, colaboradores e amigos. Hoje, somos conceituados e reconhecidos da região sul do país até o nordeste — conta, orgulhoso, o presidente da organização Nei Rudimar Leite Costa, que também é pai de Francinei.
A partir de 2024, será colocado em prática o projeto de campeonatos por mesorregiões, assim, cada localização do Estado terá um vencedor para representá-la no campeonato estadual, disputado em Porto Alegre.
— É preciso haver esse reconhecimento no Brasil, para mostrar que é possível, através do esporte, modificar a vida dos sujeitos. É um esporte em que pretendo continuar ainda por muito tempo — conclui Francinei.