É lastimável saber da existência de agentes públicos e políticos dispostos a tirar proveito pessoal da onda de solidariedade que se espalhou pelo país para auxiliar os gaúchos atingidos pelo mais grave desastre climático da história do Estado. Operações do Ministério Público (MP) e apreensões executadas pela Polícia Civil nos últimos dias mostram o desvio de donativos, notadamente para obter benefícios eleitorais.
Operações do MP e apreensões da Polícia Civil mostram o desvio de donativos, notadamente para obter benefícios eleitorais
As investigações apontam que pessoas em funções públicas, pagas para servir à sociedade, estariam se apropriando de doações para oferecê-las a outros cidadãos, em troca de voto nas eleições municipais de outubro. Há ainda a situação de suspeitos, com acesso privilegiado aos locais que guardam donativos, em busca de vantagem econômica.
Em Palmares do Sul, um vereador e um secretário da administração local são investigados por crimes como apropriação indébita, peculato e associação criminosa. Mercadorias que deveriam socorrer flagelados foram encontradas na residência do parlamentar suspeito. A operação foi deflagrada na terça-feira pelo MP.
O caso de Palmares do Sul, no Litoral Norte, está longe de ser isolado. Também na terça-feira, a Polícia Civil apreendeu quatro caminhões que deveriam estar em locais oficiais para coleta de doações em Alvorada, na Região Metropolitana, mas encontravam-se em casas particulares. São ao menos 11 envolvidos nas possíveis irregularidades, incluindo servidores públicos do Executivo e do Legislativo locais. No dia 25 do mês passado, o MP fez uma ofensiva semelhante em Eldorado do Sul que mirou três membros da Defesa Civil do município. Dois eram pré-candidatos às eleições que se avizinham e, conforme as investigações, também estariam desviando as doações com objetivos eleitorais.
Ao que aparece, novas situações semelhantes virão a público. A sociedade aguarda que as autoridades permaneçam atentas e diligentes para coibir práticas repulsivas e criminosas como essas e as investiguem a fundo onde estiverem em curso. Defesas civis e demais órgãos envolvidos nos esforços humanitários, da mesma forma, têm o dever de redobrar o controle para evitar essa prática. Esperam-se também apurações rigorosas, que em um segundo momento resultem em punições pedagógicas que levem até ao afastamento dos eventuais responsabilizados das funções públicas.
A catástrofe climática no Rio Grande do Sul demonstrou a generosidade de brasileiros de todos os cantos do país e dos gaúchos não atingidos pelas enchentes, que se mobilizaram rapidamente para doar impensáveis quantidades de itens de primeira necessidade aos atingidos. É sem precedentes o volume de donativos que chega aos pontos de coleta e distribuição dos municípios afetados.
Por outro lado, tristemente se constata que nem todos se compadecem com a calamidade. Há uma minoria de oportunistas que saqueia, aplica golpes de todo tipo e tenta se locupletar, usando para benefício próprio materiais, roupas e alimentos, ao fim, retirados de quem sofreu perdas severas com as cheias e necessita de amparo para se reerguer. A esses, aproveitadores da tragédia alheia, deve ser reservado o rigor da lei.