São múltiplas as consequências da brutal tragédia climática que se abateu sobre o Estado. Elas aparecem em áreas como infraestrutura, economia, educação e saúde, entre várias outras, com numerosos desdobramentos. Por qualquer ângulo que se olhe, há um problema de vultosas proporções a necessitar de uma solução imediata e, ao mesmo tempo, que sinalize uma perspectiva de futuro. Uma dessas preocupações é encontrar destinação adequada às montanhas de entulho, lixo e resíduos gerados pela enchente.
Devem ser buscados a reciclagem e o reaproveitamento de parte desse material, para mitigar potenciais repercussões negativas
É espantoso o cálculo referente ao volume de entulho de origem da construção civil criado pela força avassaladora das águas. Conforme projeção do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da UFGRS, elaborada com a colaboração de voluntários e da empresa Mox Debris, seriam mais de 46 milhões de toneladas, resultado da avaria ou destruição de 400 mil construções urbanas. Para se colocar esse volume em perspectiva, pode-se lembrar que, antes das chuvaradas, a Emater estimava que o Estado todo teria uma safra de grãos de verão de 35 milhões de toneladas. Pois a quantidade de escombros – materiais como tijolos, telhas, madeira e aço – pesa um terço a mais.
Ainda está fora desse cômputo a imensa quantia de móveis, eletrônicos, roupas, geladeiras, fogões e carros que estragaram e vão virar rejeitos e sucata. Nas áreas urbanas alagadas onde a água já baixou, são desoladoras as cenas de mobiliário estragado depositado nas calçadas à espera de recolhimento. Consultoria especializada no setor automotivo, a Bright Consulting projeta em 200 mil a quantidade de veículos perdidos no Rio Grande do Sul nos alagamentos.
A gestão adequada desses resíduos será desafiadora para o poder público. Reconhece-se que os aterros existentes no Estado não suportam tamanho volume em tão pouco tempo. A dificuldade aumenta porque há muito material mesclado e, diante das demais urgências ocasionadas pela tragédia, uma separação por tipo de material fica relegada a segundo plano. Mas devem ser buscados a reciclagem e o reaproveitamento de parte desse material, para mitigar potenciais repercussões negativas. Caso contrário, corre-se sério risco de criar um impacto ambiental ainda maior pelo descarte inapropriado, com contaminação de solo e mananciais. Há materiais tóxicos misturados. As montanhas de resíduos também se tornam locais propícios para a proliferação de vetores de doenças. Surge, assim, um problema de saúde pública.
Em especial na Região Metropolitana, também foram perturbadoras as imagens que mostraram a profusão de lixo doméstico de todo tipo boiando nas regiões alagadas. Além das falhas de manutenção nos sistemas de drenagem, por óbvio esses resíduos, ao obstruírem bocas de lobo, bueiros e dutos que deveriam ser usados para escoar a água, contribuíram para a continuidade das inundações. Entre as variadas reflexões que a tragédia em curso deve suscitar, uma delas é a conscientização da sociedade quanto à produção, separação e destinação correta de lixo.