Mostra-se bastante atabalhoada a operação montada pelo governo federal para importar até 1 milhão de toneladas de arroz. A justificativa seria garantir o abastecimento doméstico e evitar uma alta especulativa de cotações em função de tragédia climática no Rio Grande do Sul, responsável por 70% da produção nacional. O próprio ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, defendeu a iniciativa alegando uma elevação de preços “de 30% a 40% em um mês”, o que classificou de “inconcebível”. De fato, seria.
O risco é criar um desequilíbrio no mercado que desestimule os produtores de arroz para a próxima safra
É verdade que, logo após o início das enchentes, o mercado foi tomado por rumores. Mas os números de inflação ao consumidor mais recentes contam uma história diferente. Conforme o IPCA-15 de maio, divulgado na terça-feira, o preço do arroz no país recuou 1,25% ante o mês anterior. Isso não significa que está barato para os brasileiros. Pelo contrário. Tanto que, em 12 meses, a alta é de 25,9%, por fatores domésticos e internacionais de oferta e demanda anteriores. Inexiste qualquer relação com as cheias recentes, portanto.
No último dia 20, o governo federal teve de suspender um leilão para importar arroz do Mercosul. Fornecedores dos países vizinhos elevaram de forma abrupta as cotações pelo movimento de compra há pouco inesperado pelo mercado. A operação acabou abortada pela especulação, algo que o governo afirmava tentar combater. Agora, a intenção é adquirir de nações produtoras de fora do bloco, após a decisão de zerar as tarifas que existem para as importações de fora do Mercosul. O primeiro leilão, para 300 mil toneladas, está previsto para o dia 6 de junho.
Causa ainda espécie saber da intenção do governo de colocar o grão à venda no varejo em pacotes rotulados com o dizer “Arroz adquirido pelo governo federal”. Também teriam a logomarca da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). São bastante plausíveis as conclusões a apontar que, ao fim, se aproveitaria uma oportunidade para fazer propaganda governamental com o objetivo de alavancar a popularidade da gestão Luiz Inácio Lula da Silva.
Essa hipótese de viés populista é reforçada pela decisão de comercializar o produto a R$ 4 o quilo para os consumidores. O governo diz que seria cerca de 20% abaixo da média de preços encontrados nos supermercados. Mas quem vai às compras constata que o desconto oficial parece bem maior. Ademais, é um tabelamento que, mostra o passado, pode trazer um alívio fugaz ao consumidor, mas em seguida piora o problema que tentaria resolver.
Pode até existir uma preocupação genuína com o preço de um componente básico da dieta dos brasileiros. Mas o risco é criar um desequilíbrio no mercado que desestimule os produtores de arroz para a próxima safra. Um dos principais componentes da alta observada nos preços no ano passado é a queda da área de plantio no Estado ao longo dos anos pela falta de rentabilidade da cultura, além da postura de outros países, como a Índia, de reter exportações. Se existiu, agora, uma elevação especulativa nos supermercados espalhados pelo país, foi pontual, alimentada por fake news e incertezas logísticas. Caso o governo pretenda colocar de forma duradoura um arroz mais em conta no prato dos brasileiros, o mais ajuizado é não desestimular a produção nacional, em especial a gaúcha.