Uma das tantas consequências danosas da pandemia foi a diminuição do número de transplantes de órgãos. Era natural que, em meio à emergência da covid-19, os hospitais mobilizassem o máximo possível de suas equipes e estruturas para fazer frente à avassaladora crise sanitária. Felizmente o quadro começou a se normalizar, restabelecendo a mais pessoas a esperança de vida ou melhora de seu estado de saúde.
No ano passado, a quantidade de transplantes de órgãos no Rio Grande do Sul voltou a níveis anteriores à pandemia
Reportagem publicada na segunda-feira em Zero Hora mostrou que, no ano passado, a quantidade de transplantes de órgãos no Rio Grande do Sul voltou a níveis anteriores à pandemia. Segundo a Secretaria Estadual de Saúde (SES), foram 715 procedimentos de coração, rim, pulmão e fígado, um crescimento de 20% ante 2022 e um número semelhante ao de 2019, antes da eclosão da pandemia.
Sabe-se que o episódio no ano passado envolvendo o apresentador Fausto Silva, beneficiado por um transplante cardíaco, ajudou sobremaneira a causa devido à ampla repercussão do caso. Mas ainda antes, tanto no Estado quanto no país, outras iniciativas tentaram despertar a consciência quanto à nobreza do gesto e à importância de as famílias conversarem sobre o assunto.
No final de 2021, por exemplo, oito entidades gaúchas de diferentes áreas, da medicina a atividades empresariais, lançaram a campanha Diga Sim à Doação de Órgãos. Constatava-se, à época, que cerca de 40% das famílias que perderam alguém não autorizavam a doação por desconhecer a vontade de quem partiu. Era a evidência de tratar-se de tema que deveria ser discutido com naturalidade, sem tabus. O mote da campanha era exatamente estimular que quem desejasse ajudar outra pessoa em caso de fatalidade comunicasse a vontade. Conforme a legislação brasileira, é da família a decisão de doar. Muitas vezes, é uma resolução que precisa ser tomada durante o choque de uma perda.
Há facilitadores, como o projeto Doar é Legal, do Judiciário do Rio Grande do Sul. No endereço doarelegal.tjrs.jus.br pode ser expedida uma espécie de certidão para reafirmar o propósito de ser doador. Mesmo sem validade jurídica, pode ser impresso, mostrado e postado em redes sociais, reforçando a intenção. No mesmo sentido, no portal da Aliança Brasileira pela Doação de Órgãos e Tecidos (Adote), é possível se cadastrar como doador. O registro auxilia na identificação de possível compatibilidade e no convencimento dos familiares.
Um doador falecido pode ajudar até oito pacientes com coração, pulmão, fígado, rins, pâncreas, córneas, intestino, pele, ossos e válvulas cardíacas. São previstas ainda doações em vida de órgãos como rim, quando não se coloca a própria saúde em risco, ou medula óssea, quando há compatibilidade. Mas, no caso da morte encefálica do potencial doador, com um diagnóstico regulamentado pelo Conselho Federal de Medicina e rigorosamente comprovado por exames, a decisão final passa pela família.
O governo gaúcho promete apresentar no próximo dia 26 o Plano Estadual de Transplantes do Rio Grande do Sul, com metas e previsão de capacitação e treinamento de equipes tanto para os procedimentos cirúrgicos como em relação ao acolhimento dos familiares do potencial doador. Aguarda-se que seja um programa capaz de diminuir a lista de espera por órgãos e córneas, uma angústia comum hoje a cerca de 2,6 mil pacientes no Estado.