No mesmo dia em que o observatório europeu Copernicus atestou que julho deste ano foi o mês mais quente na Terra desde o início dos registros oficiais, representantes de oito países abriram ontem em Belém, no Pará, a Cúpula da Amazônia. O encontro sediado pelo Brasil busca costurar uma cooperação regional conjunta com o propósito de frear o desmatamento da maior floresta tropical do mundo. Amenizar o ritmo das mudanças climáticas e de suas consequências mais drásticas também depende da preservação do bioma amazônico. Assim, deve-se ambicionar que, a partir do encontro, surjam compromissos concretos para deter o desflorestamento. Não só pelo combate a crimes ambientais, mas lastreados em alternativas factíveis de desenvolvimento sustentável para a população local.
Uma perturbação no regime de chuvas poderia ser diretamente prejudicial para o RS, já castigado por estiagens recorrentes nos últimos anos
Pode parecer uma questão distante do Rio Grande do Sul, mas é um problema capaz de afetar a economia brasileira e até mesmo a do Estado. A umidade gerada pela Amazônia forma os chamados rios voadores, que levam chuva para diversas regiões do Brasil, inclusive para o território gaúcho. Há alguns anos cientistas alertam para o risco de o desmatamento levar a floresta para um período de não retorno. Ou seja, não haveria mais condições de recuperar e de manter os seus serviços ambientais, como os que produzem precipitações que chegam ao Centro Oeste, ao Sudeste e ao Sul, onde se concentra grande parte da produção da agricultura brasileira.
Uma perturbação no regime de chuvas poderia ser diretamente prejudicial para o Rio Grande do Sul, já castigado por estiagens recorrentes nos últimos anos. Mas há ainda os danos indiretos. Uma menor produção nacional de grãos como o milho afetaria a oferta de um insumo essencial para a cadeia de carnes, setor em que o Rio Grande do Sul é um dos expoentes nacionais. Uma instabilidade climática poderia ainda trazer incertezas para a indústria de máquinas e implementos agrícolas. Mais da metade da produção nacional, deve-se lembrar, está no Estado.
A preservação da Floresta Amazônica, portanto, há muito deixou de ser preocupação apenas de ecologistas. Trata-se de uma necessidade econômica para o país devido aos reflexos indesejáveis que a continuidade do desflorestamento irrefreado poderá acarretar. O agronegócio é o segmento em que o Brasil é mais competitivo. É preciso cuidar das condições naturais que são decisivas para essa eficiência inigualável. Felizmente, há maior consciência. Mas ainda se deixa a desejar na implementação de uma agenda com políticas que criem condições para a sustentabilidade ser também uma alternativa viável de renda para a população amazônica. Não só do Brasil, mas de todos os países da região.
Todos os quadrantes do planeta têm sentido os efeitos dos eventos climáticos extremos. Os gaúchos sabem bem. O Hemisfério Norte, onde estão as nações mais desenvolvidas, ardeu em temperaturas recordes nas últimas semanas. Está chegando a hora de estes governos também passarem do discurso à prática, especialmente ajudando a financiar a transição energética e a proteção a ambientes naturais nos países mais pobres. A cooperação global, tão discutida e pouco efetiva, é urgente. Não há mais como negar os fatos.