Tema deixado de escanteio desde o final de 2021, a reforma administrativa começa a retornar à pauta. O presidente da Câmara, Arthur Lira, tem tratado do assunto nas últimas semanas, dizendo que considera uma das prioridades da Casa na segunda metade do ano, após a apreciação da reformulação do sistema tributário e do novo marco fiscal no primeiro semestre. Depois da votação de outras matérias de grande relevância em anos anteriores, como a trabalhista e a da Previdência, é a reforma estruturante que falta avançar. Seria uma modernização importante para o país. O texto, aprovado pela comissão especial há quase dois anos, está apto para ir a plenário.
É voltada a dar maior produtividade aos serviços públicos prestados à população, com racionalização de gastos
Para relembrar, a reforma administrativa é uma espécie de reorganização da política de RH do Estado brasileiro, com novas regras para contratar, promover, remunerar e demitir servidores. É voltada a dar maior produtividade aos serviços públicos prestados à população, com racionalização de gastos. E complementa a reforma tributária, agora em análise pelo Senado.
Um dos objetivos da iniciativa é revisar alguns privilégios e penduricalhos que, volta e meia, chocam os cidadãos. Mas, como todo tema complexo no Brasil, tende a não ter um texto final ideal, mas o possível, a partir das negociações e multiplicidades de pressões e interesses. A versão atual da proposta, que consta na PEC 32/20, aprovada em setembro de 2021 na comissão especial, prevê, por exemplo, o fim das férias superiores a 30 dias, mas é um privilégio mantido para a cúpula do Judiciário e do Ministério Público. Ainda há tempo, nas tratativas que antecedem a votação no plenário, de rever esse tipo de vantagem.
O texto atual prevê pontos como redução de jornada e de salários em até 25% em períodos de crise fiscal, permissão para o poder público firmar contratos temporários por até 10 anos e possibilidade de desligamento de servidores após duas avaliações consecutivas ou três intercaladas de desempenho consideradas insatisfatórias. São formas de corrigir desigualdades em relação à iniciativa privada. Ainda será preciso algum cuidado para evitar situações como perseguição política a servidores. Como mostrou o período da pandemia, há funções que têm justificativas para manter prerrogativas que as protejam de assédio no exercício de suas atribuições.
É natural que exista resistência das corporações contra as mudanças. Deve ser lembrado, porém, que as alterações de regras valerão apenas para os futuros servidores, e não para os atuais, que mantêm os seus direitos. Supõe-se ainda que, pela ligação histórica com o funcionalismo, o governo do PT tende a não ser um entusiasta da reforma. Mas não seria a primeira vez que o parlamento faz um avanço sem o esforço do Palácio do Planalto. Na da Previdência, o Executivo também pouco se empenhou. Caberá aos deputados e senadores dar esse novo passo rumo à modernização do Estado e à economia de recursos. Diferentes cálculos estimam uma redução de gastos de pelo menos R$ 130 bilhões em 10 anos.
É preciso atentar que, em anos eleitorais, como 2024, temas mais espinhosos tendem a não andar no Congresso. O segundo semestre de 2023, assim, surge como janela de oportunidade. Também porque Arthur Lira, protagonista na aprovação da reforma tributária, parece não querer ser lembrado no futuro apenas como regente do centrão, mas por um legado reformista à frente da Câmara.