Entrevista do economista-chefe da empresa Serasa Experian à coluna Acerto de Contas, de ZH, revela que 39% dos gaúchos estão com dívidas atrasadas, reflexo no Estado da histórica onda de inadimplência que já atinge um terço da população brasileira. Estimam as instituições especializadas que o país tenha atualmente mais de 70 milhões de endividados com bancos, financeiras, empresas de cartão de crédito, estabelecimentos comerciais e serviços essenciais como água e luz. Para evitar que a dívida se transforme em inadimplência, que ocorre quando o devedor perde sua capacidade para honrar compromissos, o país precisa dar agilidade aos programas de solução negociada de pendências, com parcelamentos, créditos e alongamento de prazos.
Nesse contexto, é inexplicável a lentidão do governo federal para implementar o programa Desenrola, prometido como uma das primeiras ações da nova administração e que já conta inclusive com reserva orçamentária para respaldar as renegociações. Anunciada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em fevereiro, durante a cerimônia de relançamento do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea), a proposta para renegociar dívidas e possibilitar o retorno dos brasileiros inadimplentes ao mercado ainda não saiu do papel nem tem data prevista para sair.
Os brasileiros, em geral, são reconhecidos como bons pagadores, mas muitos caíram na armadilha formada pelo período de inflação elevada, com juros altos e queda da renda familiar
De acordo com o planejamento inicial, o programa federal a ser desenvolvido em parceria com os bancos públicos deverá beneficiar prioritariamente pessoas com renda de até dois salários mínimos e com dívidas de até R$ 5 mil – o que, segundo os cálculos oficiais, aliviaria a situação de 50 milhões de brasileiros. Embora esteja previsto inicialmente para pessoas físicas, o programa poderá estender uma linha a pequenas empresas, por sugestão do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
A iniciativa de leiloar descontos para dívidas pendentes já vem sendo implementada pontualmente por empresas credoras como forma de reduzir prejuízos, mas sem a abrangência de um programa público como o que foi planejado pelo governo federal. Os brasileiros, em geral, são reconhecidos como bons pagadores, mas muitos caíram na armadilha formada pelo período de inflação elevada, com juros altos e queda da renda familiar. Pode ser acrescida a esses fatores, também, a tradicional carência de educação financeira da população.
Há, portanto, vários pontos a atacar para um combate eficiente à inadimplência no país. O primeiro e principal deles certamente é o reaquecimento da economia – dificultado, entre outros motivos, pelo elevado número de pessoas e empresas que não conseguem cumprir seus compromissos com o pagamento de dívidas e empréstimos. Esse círculo vicioso precisa ser rompido. Por isso, são essenciais e urgentes os programas de renegociação, que devem ser complementados por ações preventivas de orientação financeira que capacitem os jovens para o futuro. Para combater efetivamente a inadimplência estrutural – e não apenas o atual momento de calote forçado pela incapacidade dos devedores de reagir a uma circunstância adversa –, o Brasil precisa ajudar seus cidadãos para que eles também o ajudem.