Nenhum cidadão consciente das mazelas do país pode ser indiferente às condições indignas de vida de milhões de brasileiros. Felizmente, também parece existir cada vez mais indivíduos e entidades que vão além da justa cobrança de soluções pelo poder público e, abnegados, empenham-se em colaborar de alguma forma para aplacar o sofrimento de outras pessoas. Um belo exemplo de altruísmo foi apresentado na reportagem “Projetos construirão banheiros para 1,8 mil famílias no Estado”, publicada ontem em Zero Hora e na terça-feira no Pioneiro.
Merece amplo reconhecimento, portanto, o programa do CAU, batizado de Nenhuma Casa Sem Banheiro
O texto, assinado pelos repórteres Tiago Boff e Aline Ecker, mostra iniciativa criada pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio Grande do Sul (CAU-RS) no final do ano passado para, sem custos aos beneficiados, erguer em residências de famílias carentes uma estrutura adequada para que possam fazer a sua higiene de forma satisfatória. Assim, têm uma parte de sua cidadania restabelecida. É tocante especialmente o depoimento da pensionista Patrícia Reis Machado, 50 anos, moradora do bairro Guajuviras, em Canoas. Ela conta que desde a perda do apartamento onde vivia, há duas décadas, não sabe o que é um banho de chuveiro.
Merece amplo reconhecimento, portanto, o programa do CAU, batizado de Nenhuma Casa Sem Banheiro. As residências escolhidas têm um projeto completo elaborado por um arquiteto – que se dedica voluntariamente à tarefa –, com todas as instalações próprias para higiene pessoal e necessidades fisiológicas. Os recursos para a construção são repassados pelo poder público. Há, atualmente, 426 estruturas em execução, com verbas oriundas de convênios com prefeituras ou com o Estado. No momento, os municípios contemplados são Canoas, Charqueadas, Caxias do Sul, Santa Cruz do Sul e Lajeado. Em Caxias do Sul, também são parceiros o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB/RS) e o Ministério Público, que repassa verbas de condenações judiciais e de acordos extrajudiciais.
É alentador saber ainda que, em paralelo, a Secretaria Estadual de Obras e Habitação colocou em pé outro projeto de natureza semelhante e com o mesmo nome para a construção ou reforma de outros 1,4 mil banheiros em 42 cidades gaúchas. Os números quanto à carência de estruturas adequadas são estarrecedores. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 1,6 milhão de pessoas não contam com unidades sanitárias em seus domicílios no país. Na região metropolitana de Porto Alegre, seriam ao menos 30 mil. Mas o próprio CAU avalia que os dados estão desatualizados. E muitas vezes, em casas onde moram pessoas com necessidades especiais, é preciso elaborar projetos que contemplem as limitações.
Em breve, Patrícia e alguns milhares de gaúchos poderão tomar um banho quente e manter hábitos de asseio em estruturas salubres e dignas. É uma mostra de que é possível, por meio do voluntariado e em articulação com o poder público, ajudar a oferecer condições decentes de vida e de moradia para os cidadãos mais necessitados.