O afastamento do procurador Deltan Dallagnol, que, com o ex-juiz Sergio Moro, foi a face mais pública da Lava- Jato, representa o fim simbólico de um ciclo que transformou a nação. Desde o início da operação, em 2014, o Brasil teve suas entranhas expostas em público e aprendeu muitas lições. A força-tarefa chega ao término dessa fase com um saldo amplamente positivo para o país.
Pela percepção de punição aos corruptos, a operação tem lugar garantido entre as ações que mudaram para melhor a história do Brasil.
Desmontou-se um dos maiores esquemas de corrupção da história recente mundial e desmanchou-se a promiscuidade entre grandes empreiteiras, obras e setor público que atravessava décadas de governos de todos as cores ideológicas. Com a prisão de peixes graúdos da política e do setor empresarial, a Lava-Jato desfez a noção arraigada no Brasil de que roubar dos cofres públicos era parte da cultura nacional e que não haveria punição. Só por isso, a operação e os que a sustentaram entrarão para o panteão dos que viram uma oportunidade história e, contra muitos interesses, seguiram em frente para mudar o Brasil.
É certo que, ao jogar luzes nas sombras de partidos de todos os matizes e desvendar conexões ocultas de mitos da esquerda, a Lava-Jato despertou uma muralha de contrários. Aos poucos, os atingidos e seus representantes foram se rearticulando para desgastar a operação, a começar pelos que a lideraram – Sergio Moro no Judiciário e Dallagnol no Ministério Público Federal. Infelizmente, porém, os deslizes de ambos só vieram à tona porque de fato ocorreram, assim como os de outros integrantes da força-tarefa. Não há como apagar a excessiva proximidade entre ambos e a circunstância de Moro ter aceitado integrar – ou sido usado, como se viu depois – o ministério do maior beneficiado político pela prisão do ex-presidente Lula.
Também os exageros de procuradores e certos exibicionismos de ações para manter a operação sob constantes holofotes depõem contra seus articuladores. A pior delas, porém, foi a obsessão do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot em incriminar o ex-presidente Michel Temer por meio de uma desastrada delação premiada. A trapalhada interrompeu o ciclo de reformas que o governo interino vinha promovendo, agravando as dificuldades do país, e deixou à solta um dos então capitães do esquema de corrupção que assolava as estruturas de poder.
A Lava-Jato, porém, é muito maior do que suas falhas. Caberá ao futuro promover o julgamento moral definitivo dos homens e mulheres que a conduziram, mas, desde já, apenas com a criação da percepção de punição aos corruptos, a operação tem lugar garantido entre aquelas ações que tiveram o condão de mudar para melhor a história do Brasil.