O presidente Jair Bolsonaro se notabilizou pela insistência em atacar o distanciamento social pretensamente por temer o derretimento da economia. Intriga que, na prática, esta preocupação não se materialize em ações efetivas do governo para evitar, por exemplo, uma quebradeira generalizada, principalmente de pequenas e médias empresas. A realidade nua e crua é que grande parte dos empreendedores brasileiros definha ao longo da atual crise, sem conseguir acesso aos vultuosos recursos prometidos pelo Planalto, em forma de crédito, para esta difícil travessia. A gestão Bolsonaro mantém o histórico de antecessores de prometer muito e entregar pouco, com o agravante de constantemente criar conflitos políticos que nublam ainda mais o horizonte do país, obscurecendo as chances de retomada.
Depois de um início promissor na área econômica, que parecia uma das ilhas de racionalidade no governo, os compromissos vão ficando pelo caminho
Reportagem publicada na edição de ontem de Zero Hora mostrou este quadro alarmante. Dados do Sebrae RS indicam que quase dois terços das pequenas e médias companhias gaúchas que buscaram os recursos anunciados pelo governo não conseguem tomar estes recursos, oxigênio essencial para a sobrevivência das companhias e manutenção dos milhares de empregos que geram. Dos empreendedores que foram atrás do crédito para a folha de pagamento e capital de giro, 40% receberam um não como resposta e outros 23% ainda estão à espera da análise de um pedido de fôlego que pode até chegar tarde demais. Os bilhões de reais propagandeados, que não deveriam deixar ninguém para trás, conforme o slogan do Planalto, estão se tornando apenas cifras jogadas ao vento.
Depois de um início promissor na área econômica, que parecia uma das ilhas de racionalidade no governo Bolsonaro, os compromissos vão ficando pelo caminho. O ministro Paulo Guedes, encantador de plateias pelos seus discursos empolgados, não consegue cumprir as suas promessas. Chegou a falar em R$ 1 trilhão em privatizações, mas até o início da pandemia obteve apenas cerca de um décimo, e com a venda somente de subsidiárias de estatais. A proposta de reforma administrativa sequer foi enviada ao Congresso. Na tributária, o Planalto acabou praticamente alijado das discussões, após passar meses sem conseguir sequer um consenso interno. A redução da burocracia estacionou na Lei da Liberdade Econômica.
Ao mergulhar em uma crise política sem fim, o governo federal ficou paralisado na tarefa de planejar o futuro do Brasil e, ao mesmo tempo, mal consegue implementar medidas urgentes para auxiliar a população e as empresas durante a crise sanitária. Emparedado, preferiu a radicalização ideológica e se acomodou, achando-se protegido pelo aplauso de seguidores fanatizados de Bolsonaro. Enquanto o presidente luta por sua sobrevivência política, milhares de empresas que são parte do Brasil real e geram emprego e renda mendigam crédito para não terem de fechar as portas. A histórica falta de agilidade do setor público do país se agrava com a inépcia do atual governo. Assustados com o coronavírus, aturdidos pela situação econômica e atônitos pela confusão política, os brasileiros ainda esperam que o governo recupere o rumo, começando por encontrar uma forma de destravar a ajuda urgente anunciada há dois meses.