Por Aloisio Ruscheinsky, professor do Programa de Pós Graduação em Ciências Sociais da Unisinos
A Semana da Pátria evoca compreensões dissonantes de patriotismo, nacionalismo e independência. Faz décadas que o grito dos excluídos expressa essa indiscutível polifonia, ao professar que sem democracia e direitos não existe patriotismo. Vivemos um momento histórico em que o significado dos termos enunciados está sendo furtado ou subornado. Estas inversões afetam os direitos sociais e os pequenos avanços democráticos frutos de suor e sangue de brasileiros devotados ao nacionalismo.
Uma dissimulação do ser patriota leva a favorecer interesses do mercado em detrimento dos cidadãos. Um suposto nacionalismo apequenado recrimina a diversidade cultural e desdenha o multilateralismo.
O patriotismo pequeno ou restritivo vem de forma soberba se robustecendo junto ao poder do Estado brasileiro exatamente para desmontar o Estado de bem-estar e, ao abolir direitos sociais, apregoa que a cidadania já não é para todos. Uma novidade ora silenciosa, ora estridente, ora violenta pretende desqualificar um século de construção do Estado nação. Em nome do nacionalismo, da nação de bandeira verde-amarela, se apregoa contraditoriamente a morte dos diferentes: nesta pátria mãe gentil, não há espaço para as etnias indígenas, nem para a sustentabilidade ambiental.
Ora, desenvolver o bem-estar e entregar as riquezas naturais a alheios são coisas distintas. O patriotismo que se humilha por suas crenças e irracionalidades, bem como sua arrogância e ignorância, entra na disputa com o poder do Estado de direito porque pretende enquadrar a Constituição na sua própria mesquinhez. A ostentação do patriotismo às avessas e do nacionalismo sem nação desqualifica as instituições políticas da democracia moderna. A visão não republicana não compreende a riqueza da proteção da floresta amazônica e da diversidade étnica.
Se as contribuições da ciência são desqualificadas para a gestão do território, é porque a ignorância e as visões obsoletas estão em destaque. As queimadas na Amazônia com destruição da biodiversidade e das florestas soam como retorno aos tempos de Brasil colônia, quando nem nacionalismo existia.
A utopia nacionalista está sendo derrotada pela própria retórica nacionalista com apelo patriótico. Uma utopia de amor à pátria que nunca foi efetivamente realizada: a redução drástica das desigualdades. A repressão em curso impulsiona outro sentimento nacionalista para engendrar canais de expressão e contestação por meio de grupos e movimentos sociais.