A noite de terça-feira poderá vir a ser reconhecida como um marco para o início da solução de antigos problemas do Estado. Chamadas à responsabilidade, a Assembleia gaúcha e a Câmara de Vereadores de Canoas tomaram decisões que farão diferença no futuro. Ao aprovarem os projetos de lei que permitem ao Piratini levar adiante as privatizações do Grupo CEEE, da Companhia Riograndense de Mineração (CRM) e da Sulgás, os deputados, em sua ampla maioria, demonstraram senso de dever e comprovaram que é possível se desvencilhar do discurso enferrujado de que vender estatais é dilapidar o patrimônio do Estado.
Pelo contrário. Ao permitirem a continuidade do processo, ajudaram em um passo importante na direção de reequilibrar as finanças públicas, o que é benéfico para toda a sociedade gaúcha, e não para uma minoria de privilegiados. O verdadeiro patrimônio do Rio Grande do Sul é a sua população, que por isso merece melhores estradas e serviços nas áreas de educação, segurança e saúde, que hoje deixam a desejar, mas têm possibilidade de receber mais recursos se o Piratini for bem-sucedido na tentativa de adesão ao regime de recuperação fiscal da União.
O regime de recuperação fiscal é apenas o primeiro passo de uma jornada penosa
Assim como a votação na Assembleia gaúcha pode se tornar um ponto de inflexão na trajetória de anestesia do Rio Grande do Sul nas últimas décadas, a racionalidade falou mais alto entre os vereadores de Canoas, que também aprovaram a inclusão do município na parceria público-privada (PPP) do saneamento da Região Metropolitana. Área mais densamente povoada do Estado, a vizinhança da Capital tem um inaceitável baixo nível de coleta e tratamento de esgoto, que deve saltar para 87% já no final da próxima década nos nove municípios que integram o projeto. Nada mais natural e necessário do que recorrer à iniciativa privada para um projeto ambicioso e que exige vultosos recursos, muito além da capacidade da Corsan. Aumentar o valor da tarifa para quem passar a ser beneficiado não pode ser considerado um despropósito. Trata-se de um novo serviço a ser implementado, com uma série de benefícios. Os ganhos para a saúde e o ambiente serão infinitamente maiores. Para cada R$ 1 aplicado em saneamento, R$ 4 são poupados em saúde.
Merecem congratulações, portanto, todos os agentes públicos que, na terça-feira, encararam eventuais desgastes de curto prazo em nome da luta pela reversão de disfunções estruturais do Estado. No caso do regime de recuperação fiscal, é apenas o primeiro passo de uma jornada penosa. Mas não há mais espaço para se desviar do caminho. Os votos nos dois parlamentos simbolizam que o Estado pode estar despertando para uma nova era, em que cálculos populistas e eleitoreiros de curto prazo não se sobreponham mais a um planejamento de longo prazo que beneficie a esmagadora maioria da população do Rio Grande do Sul. Os gaúchos compreendem a gravidade do momento. É vital não desperdiçar a oportunidade e cobrar, de forma firme, a manutenção da rota em direção ao conserto da enguiçada máquina pública.