Por Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
A população chilena vem se manifestando contra o modelo previdenciário do país. O sistema do Chile é de capitalização e não de repartição, como o nosso. Lá, o trabalhador faz contribuições que vão para uma conta individual em uma das seis gestoras privadas de fundo de pensão. O problema é que muitas pessoas estão se aposentando com salários muito baixos, menores do que o salário mínimo local.
Existem alguns motivos para estes baixos salários. Um deles seria que a contribuição obrigatória dos trabalhadores é parca (10% do salário). Outro argumento é que os fundos de pensão não enfrentam concorrência suficiente, oferecendo baixos retornos e cobrando taxas administrativas muito altas.
Mas o argumento mais contundente, externado inclusive pelo Banco Mundial, é que o sistema, implementado pelo regime ditatorial de Pinochet, não é multipilar. Ou seja, não combinaria a capitalização individual privada com a oferta de assistência ou complementação a partir de outras estratégias comandadas pelo governo. Isso só apareceu, de forma tímida, a partir de 2008, com Michelle Bachelet. Mas ainda não resolveu o problema, de modo que a insatisfação e o clamor pela reestatização do sistema seguem fortes.
A PEC da reforma da Previdência no Brasil já propõe um sistema de capitalização. Quando questionado sobre os problemas enfrentados pelo Chile, o ministro Paulo Guedes afirma que a renda do país “...subiu tanto que, à luz do novo enriquecimento, da nova renda per capita chilena, consideram-se as aposentadorias insuficientes. Esse é um problema bom de ter”. Acontece que a OCDE, o Banco Mundial, parte importante do parlamento chileno e a população de lá não concordam.
Quando se fala em desenvolvimento humano, não existe “bom problema”. O sistema do Chile foi muito bem-sucedido em eliminar o déficit, uma vez que a gestão — e o risco — é repassado ao trabalhador e à iniciativa privada. Isso ajudou no crescimento econômico, em função do saneamento das contas públicas e do aumento da poupança. Mas, pela falta de um sistema de previdência mais completo, elevou a desigualdade e vem deixando muita gente em situação delicada.
Não se trata de ser contra a capitalização, mas de acreditar que ela pode ser aperfeiçoada em um sistema integrado de proteção social. Assim, diminuiríamos o risco de ter um “bom problema” no futuro.