Por Pedro Dutra Fonseca, Professor titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS
Causou ampla repulsa a proposta de Paulo Guedes, cotado para ministro da área econômica a depender das urnas, de um imposto semelhante ao CPMF. Mas seu anúncio mais esdrúxulo foi o de uma alíquota única, de 20%, para o Imposto de Renda. Este, sim, uma jabuticaba, pois quase todos os países usam faixas para que a incidência do tributo seja progressiva com o nível de renda. Por exemplo: na Bélgica, chega a sete faixas (com alíquota máxima de 56%); no Chile, seis (máxima 45%); na Áustria e Israel, cinco (máxima de 50%); e, nos EUA, varia por Estado.
O princípio doutrinário é tratar desigualmente os desiguais – regra simples de equidade tributária. Como pensar que quem ganha R$ 4 mil por mês esteja na mesma faixa dos de R$ 40 mil? E a mesma dos de R$ 400 mil, como jogadores e técnicos esportivos (com exceção do Renato: costumo brincar que este, por serviços prestados, mereceria ser isento de qualquer imposto).
Voltando a falar sério: mesmo o Brasil sempre utilizou tal princípio. O mais usual, na segunda metade do século 20, foi uma mediana de seis faixas e a alíquota máxima, de 50% no período de Vargas, foi a 65% no governo Goulart, voltando a 50% após 1964. Chegamos a ter 10 a 12 faixas nas décadas de 1970 e 1980, até que o saudoso Sarney, em 1988, as reduziu para três, com alíquota máxima de 25%. O mais grave é que a proposta do ministeriável, para não cair a arrecadação, contempla o fim das deduções, tidas como penduricalhos. Na prática, acaba com as deduções de educação e saúde. Uma porretada na classe média que paga escola particular, cuja dedução máxima já está defasadíssima: R$ 3.561 ao ano – ou ridículos R$ 297 ao mês. E o que justificaria punir os idosos, doentes ou grávidas que procuram poupar como precaução, ou aliviam o SUS com seus planos de saúde? Nenhum pacto civilizatório estável pode ser firmado com proposta tão descabida.
Um colega que muito respeito, adepto de teses do liberalismo austríaco, aconselhou-me a não perder tempo, pois tais medidas dificilmente seriam aprovadas. Mas como não ficar assustado quando quem a formula é cotado para um dos cargos mais importantes da república, e parece que com carta branca? Gato escaldado, não me custa pensar: se é isso que ele diz em pleno processo eleitoral, o que não faria depois?