Por Aloisio Zimmer, advogado
O povo brasileiro é humano, generoso, acolhedor, criativo e alegre. O Brasil é indígena, é africano, é europeu, e continuará com as suas fronteiras abertas para outros povos de qualquer território. Ao longo da nossa história nos tornamos um Estado majoritariamente formado por refugiados de todos os lugares do mundo e essa mistura, essa convivência entre diferentes, reflete-se em uma ação política internacional voltada para salvaguardar a paz no mundo, a defesa das causas humanitárias e a luta contra a desigualdade em todas as suas formas.
Dentro desse contexto, na Constituição de 1988, os direitos fundamentais são catalogados como valores e objetivos a serem promovidos pelo Estado. Por isso mesmo, permanecem no nosso ordenamento os institutos da anistia, da graça (ou indulto individual) e do indulto coletivo. Nos três casos, o Estado se utiliza destes instrumentos para perdoar os seus condenados, salvo nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e crimes hediondos, nos termos da própria Constituição. A anistia depende de ato legislativo, ou seja, é de competência do Congresso Nacional. Por sua vez, a graça (ou indulto individual) decorre de ato da competência do Executivo.
É medida de caráter extremo, que se refere a erros de julgamento ou a ponderações de ordem humanitária de alta relevância e existe em diversos países, como Alemanha, Estados Unidos, Inglaterra e Portugal. Por último, e também o mais utilizado, o indulto coletivo, que igualmente depende de decisão do Chefe do Poder Executivo, abrange um grupo de sentenciados, depois da avaliação de critérios objetivos (ex: cumprimento de parte da pena e gravidade do crime) e subjetivos (ex.: comportamento carcerário e antecedentes). Recentemente, abriu-se uma profunda discussão no Brasil com o sentido de estabelecer limites mais claros em relação ao poder do Presidente da República para conceder o indulto coletivo.
Em realidade, considerando a falência do sistema penitenciário brasileiro, a ampliação do campo de abrangência do indulto – respeitando-se os parâmetros constitucionais – pode representar um exemplo de ação humanitária do Estado. Todavia, discute-se no STF o seu alcance, o que poderia restringir a competência do Presidente da República, em sentido inverso ao que prevê a Constituição. É importante esclarecer que o indulto geralmente beneficia uma população prisional de jovens negros, sem ensino fundamental completo, em situação de miséria ou de extrema pobreza.
Por tudo isso, consolida-se como medida compensatória adequada, servindo como instrumento de política criminal à disposição do Estado para a reinserção e ressocialização dos condenados. Neste aspecto, o ativismo judicial que tenta discutir poderes constitucionais do Presidente da República produz mais insegurança jurídica e coloca em descrédito a própria noção de separação dos poderes sem, contudo, oferecer uma solução concreta para o problema. Dessa forma, entendemos que é mais urgente cogitar de ações e políticas eficazes, o que é compromisso dos três Poderes da República.