Correção: um país não entregável é o termo correto usado pelo autor neste artigo, e não um país não intragável como publicado das 20h05min de 3 de julho até as 10h52min de 4 de julho. O texto já foi corrigido.
Ricardo Hingel, economista
Há alguns dias, minha filha, que está começando a carreira e trabalha em uma multinacional, chegou em casa bastante angustiada, pois esta, em função de um mercado que não reage, decidira por reduzir a equipe. A empresa em questão é protagonista em seu setor e as pessoas dispensadas eram profissionais extremamente qualificados e recrutados de diversas regiões do país, muitos buscados na concorrência.
Comentei que o que ocorrera lá é apenas um triste exemplo do que vem acontecendo no Brasil desde 2014, quando o abandono de práticas óbvias de gestão pública gerou a mais grave crise em nossa economia. A recessão derrubou o PIB e jogou a conta para milhares de empresas dos mais diversos portes e milhões de pessoas perderam seus empregos. Os números atuais do desemprego, que oficialmente está próximo de treze milhões, representam uma dura estatística que ainda reflete pouco a realidade. Mesmo novas vagas que vão sendo geradas se dão com salários inferiores e dificilmente alguém se recoloca e mantém sua renda anterior.
Parte da sociedade brasileira já compreendeu que a longa recessão e seus efeitos tiveram origem exatamente no descontrole do gasto público, onde o déficit permanece elevado e a previdência segue sendo a grande incógnita para um sonhado equilíbrio fiscal.
É claro também que o atual governo federal iniciou um ajuste na economia, tendo obtido até o momento alguns êxitos, onde a redução da inflação e dos juros oficiais bem demonstram, além do fim da recessão, porém, a obra é incompleta e o equilíbrio orçamentário é ainda uma miragem. Sem condições políticas atuais de propor quaisquer novas medidas para o ajuste de longo prazo, as expectativas se deterioraram. É o nosso desalento.
Também, muito pouco vem sendo apresentado pelos principais concorrentes à presidência da república, que permita à sociedade acreditar em uma recuperação consistente e duradoura. Ouvem-se palavras de ordem, soluções para tudo, mas, na maior parte das vezes, a promessa de um país não entregável. Remédios amargos ou aritmética não existem para a maioria. Mas sonhos são em profusão, cuidado.
Pelo tamanho do setor público no Brasil, o potencial de estrago de más gestões federais é exponencial, atinge toda a cena econômica e afeta a vida de todos. Por menos que se acredite, as eleições de outubro serão definitivas, pois omissão ou rendição não resolvem. Lembremos que nosso regime político é um modelo próprio de presidencialismo de coalisão, com a repartição de cargos e orçamentos entre os aliados e onde o executivo depende do legislativo para as questões mais relevantes, logo, nos preocupemos também com a escolha destes.