O Brasil tem muito a aprender com o debate que se intensifica nos Estados Unidos sobre a posse e o porte de armas de fogo. Mesmo que as realidades sejam distintas, é preciso prestar atenção em advertências como a feita recentemente pelo jornal The New York Times sobre o flagelo representado por assassinatos em massa, como o que vitimou 14 pessoas em San Bernardino, na Califórnia. O que está em discussão lá, como destaca o jornal em editorial, é a situação absurda em que qualquer pessoa, inclusive terroristas - como se suspeita no caso em questão -, pode ter acesso a armamentos pesados.
No Brasil, o debate tem abordagem distinta, mas passa igualmente pelo descontrole em relação às armas. O primeiro aspecto é o que remete para a facilidade com que bandidos têm acesso a arsenais, de todos os tipos, para atemorizar, assaltar e matar. É óbvio que isso resulta de falhas do Executivo, do Legislativo e do Judiciário - pelas deficiências de prevenção e coerção do Estado, pela fragilidade das leis e pela incapacidade da Justiça de corresponder às expectativas de quem espera punição e reparação adequadas. A delinquência armada tem, portanto, a seu favor um Estado desaparelhado, omisso e ineficiente.
O segundo aspecto, que converge para a preocupação americana, é o que leva em conta o sentimento, provocado pela sensação cada vez maior de desproteção, de que as comunidades se sentirão mais seguras se estiverem armadas. Compreende-se o conjunto de motivações que levam a esse engano e faz com que vasto contingente da população aprove a revogação do Estatuto do Desarmamento, atualmente em debate no Congresso.
O que o Brasil precisa é de mais rigor na prevenção e também na punição de quem age armado para cometer crimes. A negligência estatal e a impunidade explicam a reincidência, a insegurança e o sentimento equivocado de que dispor de uma arma é desfrutar o direito de defesa. O Brasil precisa desarmar-se, a começar pelos bandidos que matam, muitas vezes não são presos e, se cumprirem penas, são soltos e voltam a matar.