Os israelenses reagiram com choque e fúria neste domingo (1º), depois que os corpos de mais seis reféns foram recuperados pelo Exército de Israel em Gaza. As autoridades israelenses afirmam que eles foram mortos pelos sequestradores nos últimos dias.
O maior sindicato de Israel convocou uma greve geral para esta segunda-feira (2), ameaçando fechar o país até que o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, concorde com um acordo com o grupo terrorista Hamas para devolver os reféns restantes.
Neste domingo, manifestantes se ajoelharam nas ruas e seguraram fotos dos reféns enquanto Netanyahu e seus ministros se reuniram em Jerusalém.
Corpos encontrados
Entre os que foram resgatados no sábado de Gaza pelo exército de Israel, estava o israelense-americano Hersh Goldberg-Polin, de 23 anos. Os pais dele se tornaram embaixadores mundialmente conhecidos do movimento das famílias de reféns e discursaram na Convenção Nacional Democrata.
— Precisar de nosso único filho, e de todos os queridos reféns, em casa não é uma questão política. É uma questão humanitária — disse Jon Polin, pai de Hersh, na época.
Os restos mortais de seu filho foram encontrados junto com os corpos de Carmel Gat, de 40 anos; Eden Yerushalmi, 24; Alexander Lobanov, 32; Almog Sarusi, 27; e Ori Danino, 25.
As Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês) disseram que eles foram mortos pelo Hamas "pouco antes" de serem retirados de um túnel, com vários metros de profundidade, na cidade de Rafah, no sul de Gaza.
O local fica a cerca de 800 metros do túnel onde as IDF resgataram um refém vivo na semana anterior.
Os corpos foram levados para o Centro Nacional de Medicina Legal, onde um exame determinou que os seis haviam sido mortos por "vários tiros a curta distância" nas últimas 48 a 72 horas, de acordo com Shira Solomon, porta-voz do Ministério da Saúde de Israel.
Em comunicado, o Hamas culpou os bombardeios israelenses pelas mortes, acrescentando que "se o presidente Joe Biden está preocupado com as vidas dessas pessoas, ele deve parar de apoiar esse inimigo com dinheiro e armas e pressionar a ocupação para que acabe com sua agressão imediatamente".
O Hamas ainda mantém 97 reféns, incluindo duas crianças com menos de cinco anos. Desses, 33 já foram declarados mortos pelas autoridades israelenses.
Ao longo de quase 11 meses de incerteza, muitas das famílias dos reféns acusaram Netanyahu de priorizar sua sobrevivência política em detrimento de um acordo que traria seus entes queridos de volta para casa. No domingo (1º), exigiram que o primeiro-ministro se dirigisse à nação.
Em troca, receberam uma declaração gravada:
— O fato de o Hamas continuar a cometer atrocidades como as que cometeu no dia 7 de outubro nos obriga a fazer tudo para que ele não possa cometer essas atrocidades novamente— disse Netanyahu — Quem assassina reféns não quer um acordo — completou, afirmando que o Hamas se recusou "a conduzir negociações reais".
No entanto, segundo os negociadores, Netanyahu tem sido uma das principais barreiras para um acordo. Ele tem insistido em manter a presença israelense ao longo do Corredor Philadelphi, uma zona estratégica entre Gaza e o Egito que, segundo Israel, é usada pelo Hamas para contrabandear armas, uma alegação negada pelo Cairo.
Na quinta-feira (29), o gabinete israelense votou pela permanência no corredor, apesar dos avisos de membros do alto escalão do establishment de segurança de que a medida poderia afetar um acordo.
No domingo (1º), o ministro da Defesa israelense, Yoav Gallant, que se tornou um dos críticos da estratégia de guerra de Netanyahu, exigiu que o "gabinete deve se reunir imediatamente e reverter a decisão".
Os seis prisioneiros recuperados no sábado, violentamente sequestrados em um festival de música e em um kibutz próximo no sul de Israel em 7 de outubro, foram classificados como vivos pela IDF, que tinha uma avaliação geral de sua localização. Presume-se que pelo menos quatro deles — incluindo Goldberg-Polin — estejam na lista de reféns que seriam libertados no caso de um cessar-fogo mediado pelos Estados Unidos.
Em comunicado, Biden disse que, após meses de trabalho ao lado dos pais de Goldberg-Polin e das famílias de outros reféns israelenses-americanos, ele ficou "arrasado e indignado" com a notícia de sua morte. "Não se enganem, os líderes do Hamas pagarão por esses crimes", afirmou. "E nós continuaremos trabalhando sem parar para chegar a um acordo que garanta a libertação dos reféns restantes", completou.
Também em comunicado, a vice-presidente Kamala Harris condenou a brutalidade do Hamas, chamando a morte de Goldberg-Polin de "perda terrível".
Embates
Cerca de 1,2 mil pessoas foram mortas e mais de 250 reféns foram arrastados para Gaza por militantes do Hamas em 7 de outubro. Durante uma pausa de uma semana nos combates no final de novembro, 105 reféns foram libertados. Apenas oito foram resgatados vivos pela IDF.
As famílias dos reféns inundaram as ruas de Tel Aviv repetidas vezes exigindo que Netanyahu concordasse com um cessar-fogo que garantisse a libertação dos reféns, mesmo que isso significasse comprometer sua promessa de "vitória total" sobre o Hamas.
O contra-almirante Daniel Hagari, porta-voz militar israelense, disse repetidamente que somente um acordo negociado traria de volta a maioria deles. O ministro da Defesa israelense, Yoav Gallant, defendeu que a IDF está preparada para pagar qualquer preço de operação necessário para a liberdade deles.
"Vivos, vivos, nós os queremos vivos"
À medida que a noite se aproximava em Tel Aviv no domingo (1º), os manifestantes pareciam vir de todas as direções, muitos carregando bandeiras israelenses.
— Vivos, vivos, nós os queremos vivos — cantava um grupo ao som de tambores.
"O sangue está nas mãos de Netanyahu", dizia uma placa ao longo da rota do protesto.
Sefi e Deborah, duas idosas de um kibutz na região central de Israel que está recebendo refugiados de uma comunidade próxima à fronteira de Gaza, que não informaram seus sobrenomes, relataram que participavam de protestos todas as semanas, "mas hoje é diferente".
— Chega! — disse Deborah — Isso passou dos limites.
Dezenas de restaurantes, teatros, empresas e municípios anunciaram que estavam fechando suas portas no domingo em solidariedade aos protestos.
O sindicato nacional dos trabalhadores anunciou uma greve geral por tempo indeterminado a partir de segunda-feira. "Não podemos mais ficar parados enquanto nossos filhos sofrem e são assassinados nos túneis de Gaza", destacou Arnon Bar-David, chefe do sindicato Histadrut, em um comunicado no domingo, após se reunir com famílias de reféns. "Isso é inaceitável e precisa acabar", acrescentou.
Aviva Siegel, uma ex-refém israelense cujo marido Keith ainda está preso em Gaza, disse esperar que as notícias de domingo finalmente forcem um acordo.
— Lembro-me de estar lá e sentir a morte sobre minha cabeça o tempo todo — afirmou a ex-refém — Precisamos gritar em voz alta para que eles sejam trazidos para casa. Não vou perder minha esperança. Isso me deixaria em pedaços.
Em comunicado, o Hostage Families Forum, uma organização que representa a maioria das famílias dos reféns, disse que os seis "foram levados vivos, suportaram os horrores do cativeiro e depois foram friamente assassinados". Acrescentou que um acordo para o retorno deles estava "na mesa" há dois meses. E culpou as mortes por "atrasos, sabotagem e desculpas".
O presidente israelense, Isaac Herzog, afirmou que o "coração de uma nação inteira está despedaçado" e pediu desculpas às famílias por não conseguir trazê-los de volta em segurança.
O líder da oposição, Yair Lapid, atacou o governo de Netanyahu, dizendo que as mortes poderiam ter sido evitadas por meio de um acordo.
— Em vez de salvar vidas, os reféns estão sendo enterrados. Em vez de fazer tudo para trazê-los de volta para casa, Netanyahu está fazendo tudo o que pode para permanecer no poder — argumentou.
Despedidas
Quatro dos reféns recuperados — Yerushalmi, Lobanov, Sarusi e Danino — foram enterrados neste domingo.
Goldberg-Polin será enterrado em uma cerimônia em Jerusalém nesta segunda-feira. Ele comemorava seu aniversário de 23 anos no festival de música, quando o local foi invadido por homens armados.
"Com o coração partido, a família Goldberg-Polin está devastada ao anunciar a morte de seu amado filho e irmão, Hersh", lamentou a família em um comunicado, agradecendo aos apoiadores e pedindo privacidade.
Em abril, Hersh Goldberg-Polin apareceu em um vídeo de propaganda divulgado pelo Hamas, lendo uma declaração aparentemente escrita condenando Netanyahu.
Neste domingo, o Fórum das Famílias de Reféns prestou homenagem a todos os prisioneiros mortos. Alexander Lobanov era pai de dois filhos, incluindo um bebê que nasceu enquanto ele estava em cativeiro e que agora tem dois meses. Carmel Gat era um terapeuta ocupacional que adorava viajar sozinho. Ori Danino estava planejando começar seus estudos para se tornar engenheiro. Almog Sarusi, segundo o relatório, estava no festival com sua namorada, que foi assassinada.
Eden Yerushalmi foi descrita como uma irmã devotada que falava com sua família por horas enquanto tentava escapar do ataque do Hamas. Ela foi enterrada enrolada na bandeira israelense. Seu pai desmaiou no início do funeral, lendo seu discurso em uma cadeira montada pelos paramédicos. Sua mãe, Sarit, lembrou-se de sua "gargalhada":
— Você não era apenas minha filha, era minha melhor amiga. (...) Você está sempre comigo.