O Congresso da Argentina iniciou nesta quarta-feira (31) a discussão da chamada Lei de Bases e Pontos de Partida para a Liberdade dos Argentinos, proposta pelo presidente Javier Milei assim que tomou posse. O polêmico pacote de mudanças econômicas inclui uma ampla gama de reformas em centenas de leis do sistema econômico e político do país, as quais têm sido questionadas por partidos de oposição e sindicatos.
Conhecido como "Lei Ônibus", o pacote foi apresentado com 664 artigos, mas quase metade deles foi deixada para trás com a rejeição da oposição peronista, de forças de centro-direita, governos provinciais e de diferentes setores sociais, como ciência e cultura.
O governo considera esta iniciativa como a base fundadora do seu projeto político, que tem como objetivo primordial a desregulamentação total da economia e a limitação da intervenção do Estado. Milei afirma que sem esta ferramenta regulatória, a Argentina não conseguirá reverter os seus problemas econômicos e caminhará para uma hiperinflação com custos sociais imprevisíveis. Por sua vez, a oposição reluta em aprovar o projeto porque considera que muitas das reformas não são viáveis ou requerem maior discussão.
Embora sua ambição fosse ter a lei em janeiro, o governo não tem garantia de votos suficientes. Para a aprovação, são necessários 129 votos num total de 257 deputados. Entretanto, o partido de Milei tem apenas 38 deputados do Congresso.
Se aprovado, o pacote irá ao Senado. Apenas 386 artigos serão submetidos para debate na sessão desta quarta-feira. Confira abaixo os principais pontos do pacote de reformas pretendidas pelo presidente ultraliberal.
Principais propostas
Concessões transformaram pacote
Obrigado a ceder, nos últimos dias o Executivo introduziu modificações no cerne do projeto original devido à rejeição entre os governadores provinciais, que, na Argentina, têm grande influência sobre os deputados. Na segunda-feira (29), vários governadores das províncias afetadas propuseram novas mudanças no sistema de partilha de impostos com o governo federal, o que colocou novamente em dúvida o debate sobre a lei.
O governo já havia retirado, na sexta-feira (26), o cerne fiscal do projeto, que incluía, entre outras coisas, moratórias fiscais, aumento das retenções sobre produtos agrícolas, a redução do Imposto sobre Bens Pessoais e a ampliação da base do Imposto sobre o Rendimento. A reforma do sistema eleitoral também foi abandonada.
Outra alteração significativa foi na fórmula de pensões e aposentadoria. Inicialmente, foi proposta a suspensão da fórmula atual (ajustada pela evolução da inflação e da receita), para permitir ajustes discricionários por parte do Executivo.
O Executivo abriu mão de um aumento de receita com as mudanças, mas afirmou que o equilíbrio fiscal é "absolutamente irrenunciável", antecipando que haverá um corte, que provavelmente afetará as transferências da Nação para as províncias. O texto original da "Lei Ônibus" garantia a Milei um corte nos gastos públicos de cerca de 5% do PIB, o que agora só poderá ser alcançado com outras medidas de ajuste.
Privatizações e estado de emergência seguem
Quase 40 estatais ou empresas com participação majoritária estatal são passíveis de privatização no pacote.
— O que eu puder vender primeiro, eu venderei — declarou Milei.
Contudo, a venda da participação majoritária da Argentina na empresa estatal de energia YPF, expropriada em 2012, não é mais uma prioridade porque "acarretaria uma grande perda de valor para os argentinos".
Ainda assim, empresas como Ferrocarriles Argentinos, Aysa (Agua y Saneamientos Argentinos), Aerolíneas Argentinas, Correo Argentino e Fabricaciones Militares estão mantidas na versão do projeto que será submetido à votação do Congresso, segundo o La Nación.
Governar por decreto
A nova lei de Milei também daria ao Poder Executivo a possibilidade de validar leis sem passar pelo parlamento, com imposição de um estado de "emergência pública em questões econômicas, financeiras, fiscais, segurança, defesa, tarifas, energia, saúde, administrativas e sociais até 31 de dezembro de 2025", que pode ser prorrogado por um período máximo de dois anos, diferentemente dos quatro inicialmente planejados.
Outro ponto do texto atualizado é uma reforma de Estado, com uma reorganização administrativa, que inclui a promoção de funcionários públicos por meritocracia e eliminação de sobreposições ou duplicações de funções.