Ao realizarem inspeções em presídios e penitenciárias, defensores públicos recebem com frequência queixas sobre preços abusivos aplicados por cantinas — as oficiais, que são licitadas pelo Estado, e as paralelas, administradas por facções. Desde agosto, a Defensoria Pública do Estado (DPE) tem ingressado com habeas corpus contra a portaria da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) que restringiu a lista e a quantidade de itens que familiares podem levar aos detentos durante a visita.
— Com essa medida, o Estado obriga os presos a comprarem a preços exorbitantes, diante da sua condição econômica, além de ficarem na mão das facções, que revendem os produtos na galeria — destaca a defensora pública Cintia Luzzatto, dirigente do Núcleo de Defesa em Execução Penal da DPE.
A defensoria também questiona outros pontos da portaria, como o que trata da revista de visitantes.
O Grupo de Investigação da RBS (GDI) mostrou em reportagem veiculada nesta semana que as facções reforçam o caixa do crime com a revenda de produtos comprados nas cantinas oficiais. A situação é de conhecimento do governo, que admite se tratar de um problema que interfere até na segurança dos estabelecimentos penais. As mercadorias já saem das cantinas licitadas pelo Estado por preços maiores do que os praticados na rua e ao chegarem nas galerias, nas chamadas subcantinas, sofrem sobrepreço.
Segundo Cintia, o problema envolve até mesmo itens básicos à sobrevivência, como água para beber:
— A portaria estipulou que o visitante só pode levar dois litros de água por dia de visita. Isso não é suficiente para um dia inteiro de visita e para o preso ainda ter depois. Temos prisões com problema sério de água potável, como em Osório, e de restrição do fornecimento durante o dia. Que água essas pessoas vão beber? Se a família não leva, tem de comprar na cantina, já que o Estado não fornece, assim como itens de higiene pessoal e de limpeza das celas.
Quanto à alimentação, a defensora afirmou que as inspeções mostram que há fornecimento pelo Estado e armazenamento de alimentos nas prisões, mas as reclamações de fome são constantes.
— Existe estoque de comida para três refeições, às vezes, quatro. Mas não é o suficiente, as pessoas ficam com fome devido à quantidade ou qualidade. Não adianta dizer que dá a comida, tem de ser suficiente. Até mesmo nas prisões com presença plena do Estado, temos essas queixas — explica Cintia.
Os chamados "estabelecimentos prisionais com presença plena do Estado" são novos e para os quais o governo planeja não ser mais necessária a existência de cantinas. A Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo sustenta que, em prisões novas, o Estado vai assumir a alimentação dos detentos. Em relação às subcantinas, a pasta informou que o problema tem sido acompanhado e deve ser reduzido.
Contraponto
O que disse a Susepe:
Este ano foi atualizada a normativa de visitas nos estabelecimentos prisionais, bem como o Termo de Referência para licitação das novas cantinas nos estabelecimentos prisionais, com o objetivo de padronizar os itens permitidos para ingresso nas unidades. Logo, não há disparidade entre os itens permitidos às visitas ou aos vendidos nas cantinas.