Realizada no bairro Guajuviras, em Canoas, na Região Metropolitana, a loteria ilegal do Bono a Estrela (Bônus a Estrela, em uma tradução livre) ocorre por meio de cartelas, com informações em espanhol. Os sorteios são coordenados por colombianos, conforme constatou o Grupo de Investigação da RBS (GDI), ao monitorar por duas semanas a jogatina.
Cada bilhete custa R$ 5 e contém oito sequências de quatro números. No pequeno papel com a aposta, há um aviso indicando que a cartela será anulada se tiver riscos, rasuras ou remendos (veja detalhes no gráfico abaixo).
No verso do cupom, há um carimbo com a data de validade da aposta. Cada cartela só serve para o dia em que é vendida. Mas, em caso de chuva, o sorteio é adiado e o bilhete com a aposta passa a valer para o dia seguinte.
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Segundo os vendedores da loteria ilegal, cada bilhete é único, sem possibilidade de um milhar aparecer em mais de uma cartela ou de o prêmio ser dividido.
A sequência de milhar é sorteada, número a número, em um globo com bolas. Esses sorteios ocorrem de segunda a sábado, a partir das 16h30min, em frente a estabelecimentos comerciais na avenida principal do bairro Guajuviras.
O apostador pode contatar um número de WhatsApp presente na cartela, por onde é possível acompanhar informações sobre o Bono a Estrela. Pelos stories do app, a loteria costuma publicar avisos e vídeos com sorteios e premiações.
O pagamento é realizado com dinheiro vivo, geralmente no local onde é realizado o sorteio. O número vencedor também é divulgado pelos vendedores com megafone em um carro, que circula pelas ruas do bairro.
A premiação costuma acumular de R$ 1,5 mil em R$ 1,5 mil. Ocasionalmente, há possibilidade de haver distribuição de outros brindes, como kit churrasco, para um segundo milhar sorteado.
Colombianos em Canoas
Segundo dados retirados do Banco Interativo do Observatório das Migrações em São Paulo — NEPO/UNICAMP, de janeiro de 2000 a março de 2022, 4.727 migrantes obtiveram o Registro Nacional Migratório como habitantes de Canoas. Entre as principais nacionalidades que migraram para o município, os colombianos foram a terceira mais presente, com 13%, o que representa pouco mais de 600 pessoas, atrás dos venezuelanos (29%) e haitianos (38%).
As vindas de colombianos para o município foram motivadas por fugas de regiões de conflito, ameaças de morte e confrontos armados, conforme informações da Coordenadoria de Igualdade Racial, Povos Originários e Imigrantes de Canoas. O órgão ressalta que houve casos de pessoas que se recusaram a colaborar com guerrilheiros no país.
Produto velho na Colômbia
Apesar da ocorrência da Bono a Estrela ser recente em Canoas e no Brasil, o produto é antigo na Colômbia, a ponto de estar defasado. O formato de loteria aplicado na Região Metropolitana era recorrente no país entre os anos 1980 e 1990, segundo informações do jornalista Rubén Benjumea. A atividade também é ilegal por lá.
— Aqui, por exemplo, golpistas sorteavam carros e iam de cidade em cidade, vendendo bilhetes e enganando as pessoas, pois nunca apareciam (para a premiação) — relata Benjumea.
Conforme o jornalista, hoje em dia esse tipo de delito já não se vê por lá. Ele acrescenta também que o Bono a Estrela seria difícil de ser reproduzido no país por dois motivos:
— As pessoas já não caem mais nessa armadilha. E também os mercados ilícitos, comandado por organizações criminosas, impediriam esse tipo de negócio.