O presidente da Associação Beneficente São Miguel (ABSM), Rafael França, disse ao Grupo de Investigação da RBS (GDI) que a empresa que fornece oxigênio ao Hospital Lauro Reus, de Campo Bom, deveria ter reabastecido o produto às 6h da sexta-feira, 19 de março, mas não apareceu.
Às 8h13min, segundo ele, teria começado o problema que impediu que pacientes da covid-19 entubados recebessem o ar. Seis pessoas morreram. A fornecedora é a Air Liquide Brasil.
Pela primeira vez desde o episódio, a associação que faz a gestão do hospital fala sobre o caso. O Lauro Reus também só se manifestou até hoje por meio de nota oficial, sem esclarecer detalhes do que ocorreu.
— Na véspera do evento (as mortes), o hospital entrou em contato com a Air Liquide e disse: “venham abastecer”. O funcionário entrou em contato, temos registro disso. A empresa disse: "vamos amanhã de manhã porque a gente por telemetria acompanha o oxigênio". Disseram que 6h da manhã estariam lá para abastecer o tanque. Às 8h13min aconteceu o evento e a empresa não tinha abastecido. Essa é a informação extraoficial que chegou até nós — afirmou França.
Questionado sobre quem deveria manusear as cargas reservas de oxigênio, disse que está sendo apurado na sindicância feita pelo hospital. Segundo ele, há espaços que são de responsabilidade apenas da Air Liquide Brasil, que funcionários do hospital não mexem. Ele também não soube informar se a abertura da segunda bateria reserva — quando o tanque principal e a primeira reserva terminam — é feita de forma manual ou automática.
Uma das suspeitas sob investigação é de que as duas baterias reservas estivessem abertas e tenham sido consumidas sem que os responsáveis percebessem.
— A sindicância vai nos mostrar essas etapas, quem era responsável pelo quê — conclui França.
As circunstâncias das seis mortes ocorridas na manhã de 19 de março estão sob investigação da Polícia Civil, do Ministério Público e do Ministério Público Federal. Também tramita a sindicância do hospital e uma auditoria da Secretaria Estadual de Saúde.
Contraponto
O que diz a empresa Air Liquide
Air Liquide mantém a resposta enviada em nota no dia 19/3 e reforça que não está autorizada a dar mais detalhes sobre o caso, já que o mesmo encontra-se sob investigação.
"Diante da ocorrência no Hospital Lauro Reus, de Campo Bom (RS), que suscitou questionamento quanto a possíveis falhas na distribuição interna de oxigênio, a Air Liquide Brasil esclarece:
Apesar de caber à unidade de saúde gerir o seu próprio estoque de oxigênio, a empresa mantém os tanques criogênicos monitorados por telemetria e sua equipe de logística usa esta ferramenta para garantir a confiabilidade dos abastecimentos dos clientes.
A partir das informações obtidas pelo monitoramento do tanque do Hospital Lauro Reus, a Air Liquide organizou a sua logística para reabastecer o tanque de oxigênio dentro do seu planejamento, sempre buscando otimização em virtude do apoio no combate à pandemia. Nesse intervalo, porém, na possibilidade da capacidade do tanque atingir níveis mais críticos, imediatamente um alarme é acionado para que seja ativada a central de backup de oxigênio: um conjunto de cilindros que ficam de reserva e são utilizados em situações emergenciais.
O backup de oxigênio do Hospital Lauro Reus precisou ser utilizado e a equipe de manutenção da instituição solicitou apoio da Air Liquide para o correto acionamento da central, pedido que foi prontamente atendido. É importante esclarecer, inclusive, que as equipes de manutenção de todos os clientes atendidos pela Air Liquide Brasil contam com o treinamento de sua equipe técnica para a devida operação dos tanques em diferentes situações.
A Air Liquide Brasil informa que o abastecimento de oxigênio do Hospital Lauro Reus foi imediatamente restabelecido. A Air Liquide Brasil tem empenhado todos os seus esforços logísticos, operacionais e de produção para garantir o abastecimento de oxigênio a todos os hospitais que atende em diferentes cidades do país, em consonância com a sua prática de proteger vidas vulneráveis."