Sete ex-dirigentes e servidores do Badesul se tornaram réus pelo empréstimo de R$ 40 milhões concedido à Iesa Óleo e Gás, operação que gerou calote milionário ao banco gaúcho de fomento. Em ação civil pública por improbidade administrativa, o Ministério Público (MP) requer a devolução aos cofres públicos de R$ 85,5 milhões para reparar danos causados à instituição.
A acusação ainda pede que os réus sejam condenados com a perda da função pública, suspensão de direitos políticos, pagamento de multa, proibição de contratar com o poder público e de receber incentivos fiscais. O juiz Marcos La Porta da Silva, da 7ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre, decretou, em liminar, a indisponibilidade de bens dos réus.
É a segunda ação movida pelo MP devido a empréstimos supostamente fraudulentos no Badesul de 2011 a 2014, no governo Tarso Genro. O primeiro processo mirou o financiamento de R$ 50 milhões à empresa Wind Power Energia, em que seis pessoas passaram a responder na condição de acusados, com pedido de ressarcimento de R$ 99,8 milhões ao banco.
Os calotes ao Badesul foram revelados em reportagem de Zero Hora, em setembro de 2016.
No caso da Iesa, o banco liberou o empréstimo de R$ 40 milhões em três parcelas, entre setembro e dezembro de 2012. Foi construído um estaleiro em Charqueadas destinado a produzir componentes da indústria naval. O empreendimento operou por alguns meses, mas logo fechou, e os funcionários foram demitidos. A Iesa não pagou as prestações ao Badesul, que ficou no prejuízo, e a empresa ingressou em recuperação judicial.
Na ação movida pelo MP, assinada pelo promotor Adriano Marmitt e elaborada em colaboração com a procuradora do Estado Adriana Krieger, são listadas diversas irregularidades cometidas pelos então dirigentes e servidores do Badesul para conceder o empréstimo à Iesa. Houve fragilização das normas de análise de crédito e do risco do cliente, o “rating” (nota) do cliente foi elevado artificialmente para viabilizar a operação e as garantias bancárias aceitas eram insuficientes e superestimadas, segundo o MP.
Entre os réus, cinco são ex-dirigentes do banco: Marcelo Lopes (ex-diretor-presidente), Pery Sperotto Coelho (ex-diretor-vice-presidente), Lindamir Verbiski (ex-diretora de Operações), Luís Alberto Bairros (ex-diretor administrativo) e Mario Vargas Oliveira (ex-diretor Financeiro). Os outros dois acusados, que eram superintendentes, são Luiz Felipe Badia e Marcelo Correa Perez, sendo este último o único a permanecer em atividade no banco por ser servidor de carreira.
A acusação do Ministério Público (MP) destaca que a Iesa estava com “grave restrições cadastrais”. Por este motivo, já não conseguia buscar crédito em outros bancos, como o BNDES. O Badesul, que atua principalmente como repassador de dinheiro de instituições maiores, teria resolvido emprestar dinheiro próprio, mesmo sabendo da situação precária da tomadora do financiamento.
“Em que pese a interpretação do Badesul, os indicadores do ‘relatório de análise’ revelaram que a Iesa Óleo e Gás se encontrava em frágil situação econômico-financeira, mas em suas conclusões atestou que a empresa estaria em uma situação financeira adequada”,
registrou o MP, apontando “manipulação” para ajustar o negócio.
A peça é pessimista quanto às chances de resgate do dinheiro perdido no processo de recuperação judicial da empresa: “as perspectivas de recuperação do crédito são quase inexistentes pelas irregularidades das garantias aceitas no momento da contratação”.
O banco, na assinatura de contrato, acatou como garantia o terreno onde a empresa se instalou em Charqueadas, que foi doado pela prefeitura, com cláusula de reversão do imóvel.
A acusação, que contou com elementos de auditorias do Tribunal de Contas do Estado (TCE), cita eventual desvio de finalidade das verbas: “o serviço de auditoria estadual, em suas conclusões, atestou que os recursos recebidos no montante de R$ 40 milhões não foram integralmente utilizados na construção da unidade industrial de Charqueadas da Iesa Óleo & Gás, sendo que o Badesul tinha ciência e quedou-se inerte, revelando condescendência”.
Para apurar a eventualidade de crimes contra o sistema financeiro no âmbito penal, foi aprovado o compartilhamento das peças com a Polícia Federal, que já tem inquérito em andamento, e com o Ministério Público Federal.
Contrapontos
O que diz Marcelo Lopes
“As duas operações em questão – WPE (Wind Power Energy) e Iesa – seguiram o rito técnico para aprovação, como as outras quatro mil operações aprovadas na nossa gestão no Badesul.
As operações possuem garantias. A da Iesa está disponível desde maio de 2015 para o Badesul. Está sendo precipitadamente considerado recuperação judicial como falência. Nenhuma das empresas faliu, portanto não há que se falar em perda para o Badesul. No âmbito judicial, com a garantia do contraditório e ampla defesa, a verdade e a justiça prevalecerão.”
O que diz Lindamir Verbiski
“O empréstimo para a Iesa e também o aprovado para a Wind Power foram operações bancárias típicas de instituição financeira que trabalha com recursos de longo prazo. Foi obedecido rigorosamente o rito processual normal do Badesul.
À época, as operações apresentavam elementos de convicção de ordem econômico-financeira e estratégica para o desenvolvimento do Estado absolutamente suficientes para a sua aprovação por todas as instâncias deliberativas do Badesul. Sempre houve garantias suficientes para cobrir a dívida e as empresas em questão estão num processo de recuperação judicial, não significando o fim delas.
Portanto, é bastante prematuro afirmar que ocorreu prejuízo. Tenho certeza de que, ouvidas as defesas, no âmbito do Judiciário, todo esse mal entendido se dissipará.”
O que diz Marcelo Correa Perez
“As avaliações feitas pelas instâncias internas da agência, inclusive a que eu integrava, transcorreram com normalidade e a partir de avaliações que seguiram as normas então vigentes. Acatando sugestão de relatório de sindicância interna, o Badesul abriu expediente administrativo disciplinar. Esta comissão disciplinar presidida por procuradora indicada pela Procuradoria-Geral do Estado isentou-me de qualquer tipo de responsabilidade, concluindo pela absolvição total. Acredito e aguardo que, brevemente, seja esclarecida definitivamente esta situação, que tanto tem afetado a imagem da instituição e a honra de funcionários que sempre estiveram comprometidos com o correto desempenho de nossas responsabilidades.”
Pery Sperotto Coelho, Luís Alberto Bairros e Mario Vargas Oliveira
Contatados pela reportagem, não se manifestaram.
Luiz Felipe Quintela Badia
Não foi localizado pela reportagem.