O comércio de diplomas de mérito para vereadores, prefeitos e secretários municipais será investigado pelo Ministério Público (MP) do Rio Grande do Sul após o Fantástico, da TV Globo, denunciar neste domingo (5) que políticos usam recursos públicos, por meio de diárias, para receber premiações. Para demonstrar a falta de critérios na concessão desse tipo de reconhecimento, a reportagem incluiu um jumento entre os “prefeitos nota 10 do Brasil”.
As empresas alegam realizar consulta telefônica ou analisar indicadores sociais municipais antes de selecionar os agraciados. Só que essas avaliações, muitas vezes, não ocorrem. Em seguida, políticos são procurados pelos institutos, que oferecem a condecoração em troca de valores. Alguns não aceitam participar.
Em Terra de Areia, no Litoral Norte, o Instituto Tiradentes apontou Pedro Henrique Gross (MDB), chefe de gabinete do prefeito, como segundo vereador mais atuante do município. O instituto diz ter feito pesquisa em outubro de 2017, cinco meses após Gross ter se licenciado do mandato.
— Fiquei confuso porque não estava na Câmara como vereador, né? — relata o político, que decidiu não receber o prêmio, pelo qual teria de pagar R$ 578.
Dados do Tribunal de Contas do Estado (TCE) mostram que, em três premiações realizadas em Porto Alegre em 2016 e 2017, o instituto faturou R$ 116 mil em quase uma centena de Câmaras e prefeituras.
— A empresa, pelo que vimos, atribui o prêmio em decorrência de pesquisa telefônica feita com eleitores. E que não é comprovada, o que revela fraude — diz Valtuir Nunes, porta-voz do TCE.
Promoção pessoal e lucro para empresas
Para o chefe do MP, Fabiano Dallazen, “esses eventos visam à promoção pessoal do agente público e ao lucro das empresas”. O especialista em gestão pública, Aloísio Zimmer, diz que o mais preocupante são as notícias falsas geradas como repercussão das premiações, especialmente em blogs e redes sociais, o que pode, inclusive, influenciar eleições:
— Cria-se até mesmo uma implantação de falsas memórias no cidadão que depois será eleitor, porque o prefeito passa uma imagem de bom gestor.
Administração de jumento foi considerada “nota 10”
A empresa União Brasileira de Divulgação (UBD), de Pernambuco, também usa o pretexto de organizar seminários para oferecer premiações a políticos. Para demonstrar a falta de critérios na concessão dos títulos de “gestor nota 10”, a equipe negociou a compra de diploma e medalha a um jumento, o Precioso, de Paulista (PE). O custo da honraria foi de R$ 1.480.
O repórter se fez passar por assessor de três prefeituras gaúchas. Inicialmente, adquiriu dois certificados para prefeitos reais, que autorizaram o uso de seus nomes para desvendar a farsa.
Na cerimônia de entrega da premiação em Brasília, verificou-se que o seminário se resumia à entrega das homenagens.
A equipe do Fantástico conseguiu incluir o jumento Precioso na lista dos supostos cem melhores prefeitos do país ao negociar com o diretor da UBD, Fernando Vieira da Cunha.
A compra da honraria foi feita por meio de troca de mensagens.
Precioso, então, foi convidado a receber a medalha de mérito e o diploma Gestor Nota 10 em outro encontro, desta vez em um hotel de Recife (PE). Ele teria sido aprovado em saúde, infraestrutura, educação, assistência social e transparência pública. Convidado pelo repórter a entregar o diploma no lado de fora do hotel, Cunha deparou com o jumento. Questionado se sentia vergonha em conceder um diploma ao animal, disse:
— Não, porque esse aqui carregou Jesus Cristo, ou não?
Contraponto
O que diz o Instituto Tiradentes
Por meio de nota, o instituto informa que não comercializa medalhas e diplomas de mérito, nem certificados de participação em seus seminários, que são emitidos, apenas, àqueles participantes presentes em pelo menos 75% dos seminários.