Se esta quarta-feira (4) marca um mês da enchente que devastou parte do Vale do Taquari, o período em que os alunos das escolas de Muçum ficaram afastados das escolas é ainda maior. Dez dias antes de o rio encher, o pequeno município já havia sido atingido por uma forte chuva de granizo, que destruiu casas e prédios públicos — entre eles, as instituições de ensino.
— Na Escola Castelo Branco, o granizo destruiu o andar de cima. Depois, a enchente destruiu embaixo — resume a secretária municipal de Educação, Juceli Baldasso, sobre uma das escolas mais afetadas.
Na parte mais alta da cidade, a Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Jardim Cidade Alta foi poupada do mais recente evento climático, apesar do telhado destruído pelas pedras no mês de agosto. Mesmo assim, ainda é a melhor estrutura para receber não só os seus 113 alunos matriculados, mas outros 180 que vêm das escolas Castelo Branco e Alternativa.
— A gente vai criar uma escola fictícia, onde eles se sintam abrigados e em casa. Não é a escola deles, mas também não será a Escola Jardim Cidade Alta. Então, com eles, vamos criar esse nome — diz a professora Terezinha Dal Magro Nardi, carinhosamente chamada de "Prof Têre".
Para acolher os novos alunos, foi necessário realizar uma adaptação de espaços. A sala que era de artes passou a ser de aula, bem como o local que abrigava um dormitório. Também foi necessário reduzir o tempo dos alunos dentro da escola, que antes ficavam em turno integral — das 6h às 18h — nos cinco colégios da cidade. Agora, os 450 alunos do Jardim ao 5º ano estarão divididos entre a Cidade Alta e a Escola Municipal de Educação Infantil (Emei) Pingo de Gente.
— Dividimos em turmas, manhã e tarde. Assim a gente consegue receber esses alunos em duas escolas, meio turno — explica a secretária Juceli.
Para uma melhor readaptação e acompanhamento de nível, os estudantes vão permanecer com a turma que estavam antes da parada. Ou seja, estudantes de um mesmo ano de escolas diferentes não serão juntados na mesma sala de aula.
Já os professores agora trabalham em conjunto. A nova escola também passa a ter agora três diretoras: Jerusa Patussi, do Cidade Alta, ganha como companhia as diretoras Ana Luiza Bettinelli, do Castelo Branco, e Tamires Lorenzon, do Colégio Alternativo.
Durante a terça-feira (3), enquanto uma equipe limpava a escola, outra planejava a recepção. A principal ideia foi colocada em prática nesta manhã, com uma dinâmica de grupo.
— São três escolas que agora formam uma nova escola. A gente vai trabalhar com uma história, de uma escola de chuva, que foi destruída, que o prédio em si não tinha tanta importância. Que o importante eram as pessoas que faziam esse ambiente, os alunos e professores que podiam reconstruir essa escola. As "profes" vão construir um telhado e cada aluno vai colocar um tijolinho, dizendo o que espera dessa nova escola — explicou Jerusa sobre a atividade realizada na quadra da instituição.
Às 8h30min, dezenas de olhares atentos acompanhavam a professora lendo o livro Escola de Chuva, de James Rumford, que conta a história de Tomás e seus irmãos, que têm como a primeira tarefa de aula a reconstrução do colégio. Algo bem semelhante ao vivido pelos alunos de Muçum.
Ainda que esteja em segundo plano neste primeiro momento, os professores ainda discutem como retomar os conteúdos curriculares, mas respeitando os traumas e as individualidades de cada criança, e até mesmo dos profissionais que também perderam seus materiais.
— Nossa ideia não é deixar o conteúdo de lado, mas primeiro atender o emocional, acolher, mostrar que a escola está aqui, que os professores estão aqui, para futuramente falar de português, de matemática, mas o primeiro momento vai ser esse emocional — refletiu a diretora da Castelo Branco, que agora passa a trabalhar na Cidade Alta.
Totalmente destruída pela enchente, a Escola Castelo Branco deverá ser reconstruída. Já a estrutura da Emef Alternativo foi condenada, e o colégio será fechado de forma definitiva, para lamento da costureira Graziela Tremarim, que trabalha em frente e deixava o filho, Igor Tremarim Capitanio, 5 anos, todos os dias enquanto trabalhava.
— Ele até que tá feliz, pelo ambiente novo. Pra mim vai ficar um pouco mais difícil, porque aqui era mais perto né? — diz Graziela, que agora ficará a cerca de cinco quilômetros de distância da escola nova.
A secretária de Educação, no entanto, garante que os ônibus escolares estão operando e tiveram rotas reajustadas para atender a todos os alunos, inclusive aqueles de locais mais distantes.
Chuva assusta e diminui presenças
Desde a madrugada, uma chuva forte atinge o Vale do Taquari, com algumas rajadas de vento. Dessa vez, não houve destruição, mas os traumas recentes provocaram medo entre pais e professores.
— Cheguei a sonhar que a enchente levava as coisas de novo — confidenciou uma das diretoras.
A chuva chegou a provocar falta de luz, só normalizada pela manhã. Quando os primeiros alunos chegaram, às 6h, a escola ainda estava sem energia. O evento também foi um teste para o telhado novo, reconstruído após ser destruído pelo granizo. Com poucos ajustes a serem feitos, a nova cobertura suportou bem a chuva e não influenciou na rotina escolar.
Mesmo assim, o número de presentes foi menor do que o esperado. Na Educação Infantil, apenas metade dos alunos compareceu. No Fundamental, foram cerca de 70%.