O ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, afirmou nesta sexta-feira (26) que dados do sistema de alerta de alteração na cobertura vegetal da Amazônia, levantados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), não deveriam ser divulgados para a sociedade assim que ficam prontos, como ocorre hoje.
— Durante o período em que o Ibama está em ação, esse dado não deveria ficar exposto porque a gente estaria dando a chave para o bandido. Eu quero é pegar quem está cortando (árvores) de forma irregular — disse em seu primeiro grande encontro como ministro com a comunidade científica, na reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Campo Grande.
Pontes se referia ao sistema Deter, que dispara alertas diários para o Ibama para ajudar no controle do desmate. Os dados ficam disponíveis no site do Inpe. A forma como se daria o fechamento de dados não foi esclarecida pelo ministro ou por sua assessoria.
O Inpe e os sistemas de monitoramento de desmatamento entraram na mira do presidente Jair Bolsonaro, que afirmou que não confia nos dados divulgados pelo instituto após dados de alta de alertas de desmatamento do Deter em junho.
Pontes afirmou que Bolsonaro reconheceu ter exagerado no tom e disse que tudo será resolvido internamente.
— Eu vi a Amazônia do espaço muitas vezes e digo a dificuldade que é tirar fotos [da floresta] porque ela é coberta por nuvens, às vezes fumaça — disse.
— O fato é que é difícil fazer essa observação mais precisa, mas isso não quer dizer que os dados sejam incorretos. Eles estão lá e são dados de alerta, estão aí para isso.
Pontes afirmou que os dados do sistema Deter não têm a finalidade de reportar o desmatamento, algo que próprio Inpe corrobora em seu site. A taxa mensal é calculada por um outro sistema, o Prodes, cujos dados consolidados são divulgados apenas uma vez ao ano.
No entanto, existe uma correlação significativa entre os dados de alerta mensais e os dados de desmatamento anual, o que mostra que o Deter pode ser lido como indicativo de tendência.
Questionado sobre a permanência de Ricardo Galvão na presidência do Inpe, Pontes disse não ter resposta.
— Para ser bem sincero, eu não sei sei se ele fica, se ele mesmo vai ter clima de ficar. Preciso conversar com ele. Ficou uma situação complexa, meio desagradável, mas vamos conversar.
Pontes disse que o governo ficou insatisfeito com a forma que Galvão reagiu ao dar entrevistas à imprensa em resposta às críticas de Bolsonaro, que não só questionou a idoneidade dos dados do Inpe como sugeriu que o presidente do instituto estaria a serviço de alguma ONG.
Para o ministro, a confusão se deu por falha de comunicação. Ele se explicou sobre a nota que divulgou em rede social na qual dizia "entender e compartilhar a estranheza" expressa por Bolsonaro em relação aos dados do Inpe e afirmou nesta sexta (26) que os resultados são confiáveis.
— É um instituto conceituado que faz um trabalho muito bom e é reconhecido internacionalmente. Eu tenho um apreço muito grande pelo Inpe, que é da minha área. Ele vai continuar fazendo seu trabalho como tem feito. O fato de eu perguntar a respeito de um dado, uma variação, como já foi feito anteriormente, é normal. Tem que encarar sem emoção. É igual a conta de água. Imagine que a média de gasto é de R$ 50 e de repente aparece um gasto R$ 100. Você vai querer entender, descobrir se tem algum cano vazando — disse Pontes em entrevista a jornalistas.
Pontes diz que é possível aperfeiçoar o sistema de detecção de desmate e que estudos estão em andamento.
Na manhã desta sexta (26), uma longa fila de estudantes se formou na entrada do teatro Glauce Rocha, do campus da Universidade Federal de Mato grosso do Sul, em Campo Grande, onde o ministro falou para centenas de estudantes e pesquisadores.
Ponte foi recebido com uma mistura de aplausos e vaias. Bem visto entre cientistas por defender desde o início de sua gestão a ampliação de recursos para a ciência, passou a ser alvo de críticas na semana passada quando endossou as críticas de Bolsonaro ao Inpe.
Em uma das perguntas feitas pelo público ao ministro, um aluno pediu para que Pontes explicasse seu posicionamento.
— No começo do governo acreditei tanto no senhor e agora me sinto decepcionado — disse, sem se identificar.
Pontes se disse otimista quanto ao futuro, mas também afirmou que os problemas da área de ciência e tecnologia não serão resolvidos "em dois ou quatro anos". Ele diz que tem buscado apoio da comunidade científica e de membros do Congresso Nacional na tentativa de ampliar os recursos para a pasta. O CNPq, entidade de fomento à pesquisa ligada à pasta precisa de mais de R$ 300 milhões para conseguir honrar o pagamento de bolsas de pós-graduação até o fim do ano.
A expectativa do ministério é que o orçamento de 2020 recupere os investimentos aos níveis anteriores aos sucessivos cortes dos últimos anos, de cerca de R$ 6 bilhões. Para isso, seria preciso dobrar o valor atual do orçamento direcionado ao MCTIC (Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações).
Pontes disse que há vontade governamental de ampliar esse orçamento, mas defendeu que as manifestações de apoio sejam feitas junto a parlamentares e membros do Ministério da Economia.
— O Paulo Guedes não me aguenta mais — disse ele.