Quem caminha no Centro Histórico de Porto Alegre percebe que cresce o número de ambulantes ao ter de fazer zigue-zague entre dezenas de cangas e araras que se acumulam pelas ruas e calçadas. Mas o comércio ilegal, o contrabando e a pirataria prejudicam o desenvolvimento econômico e geram problemas sociais muito além do que se vê nas ruas.
Para atacar esse problema, a prefeitura da Capital divulgou, oficialmente, nesta segunda-feira (18), que aderiu ao Movimento Legalidade, uma parceria com a Frente Nacional de Prefeitos (FNP), o Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO) e o Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP), com participação de mais de 70 entidades empresariais e organizações da sociedade civil.
Presidente do ETCO, Edson Vismona destacou que o programa não tem "nada contra o comércio popular", mas "tudo contra o comércio ilegal".
— a imagem romântica de que combatemos os camelôs, mas, na verdade, queremos atacar a grande estrutura que está por de trás desses ambulantes, do crime organizado que se beneficia e transforma o lucro em violência, porque o contrabando financia o tráfico de armas e de drogas — ressaltou Vismona.
Para embasar a investida, o advogado trouxe números do FNCP: somente em 2016, a venda desses produtos irregulares gerou cerca de R$ 954 milhões em evasão fiscal aos cofres da Capital. O principal produto contrabandeado é o cigarro: dados da consultoria Kantar mostram que até julho deste ano, ele representou quase 38% do mercado ilegal em Porto Alegre.
Além de combater a informalidade e o crime, o programa, já lançado em outras três cidades, São Paulo, Recife e Campinas, tem como objetivo criar estratégias, entre o poder público e entidades privadas, para contribuir com o desenvolvimento da sociedade, para a geração de empregos e renda e para a segurança.
Para isso, deverá ser criado um comitê, comandado pela Secretaria Municipal de Segurança. Um dos principais objetivos é, pda união das polícias, identificar onde ficam os depósitos de produtos ilegais, quem os abastece e atacar na "carne" o problema.
Depois do anúncio oficial, houve a inauguração da exposição Cidade do Contrabando, uma maquete feita com produtos apreendidos, e a destruição de produtos apreendidos no Centro Histórico, como CDs e óculos (foto acima), como forma de simbolizar a iniciativa lançada.
Desmonte na fiscalização
Praticamente extintos da área central desde a inauguração do PopCenter, em 2009, quando o centro de compras recebeu os ambulantes, os camelôs voltaram a ocupar as vias nos últimos dois anos. A Rua da Praia é um dos pontos preferenciais para a venda de bugigangas como eletrônicos, brinquedos, roupas, relógios e outros itens.
— Fora a concorrência desleal, porque eles não pagam impostos e não cumprem as regras, ainda tapam nossa vitrine e impedem muitas pessoas de entrar na nossa loja — disse a gerente de uma loja de sapatos, que prefere não se identificar, na manhã desta segunda-feira.
Diretor do Center Shop, Jorge Capelari, durante a cerimônia, lembrou de projetos já lançados por administrações anteriores que não foram adiante.
— Toda vez a gente volta à estaca zero, porque são projetos de governo, mas o problema é de Estado — afirmou Caelari.
Hoje, um dos principais obstáculos à regularização do comércio ambulante é o desmonte da estrutura de fiscalização. O número de fiscais do município despencou nada menos do que 90% ao longo dos últimos 14 anos: de 175 agentes, restam apenas 17 para fazer frente a um universo de ambulantes estimado em até 4 mil pessoas.
O prefeito Nelson Marchezan reforçou os dados e lamentou dizendo que esse número não iria ser aumentado, porque a folha da prefeitura já está acima do limite. Por isso, reforçou a necessidade de integração entre os fiscalizadores.
— Já adotados a integração das polícias com a Guarda Municipal. Isso aqui (a cerimônia de lançamento) não e o início, é um marco das nossas ações. Em breve, vamos anunciar os primeiros resultados — prometeu Marchezan.
Enquanto isso, "Óculos de sol por apenas R$ 20", "Compro e vendo joias", "Quer pano de prato, antena de tevê e cigarro? Tem. CD e DVD piratas? Aqui tem também" continuarão a ser frases gritadas em meio à multidão que percorre a Rua da Praia, a Rua dos Andradas, a Avenida Borges de Medeiros e tantas outras vias todos os dias.
Um dos pontos enfatizados pelo Movimento Legalidade e atuar também na educação e conscientização dos consumidores. Porque enquanto continuar havendo quem compra, haverá comércio ilegal.
Os óculos foram um dos produtos citados como exemplo de um sistema reverso pelo vice-presidente Financeiro da Federação do Comércio de Bens e de Serviços do Estado (Fecomércio-RS), André Luiz Roncatto:
— Quem mais perde com o comércio ilegal é o consumidor. Vou citar três setores: o ótico, porque oferece risco a visão; o farmacêutico, porque coloca em risco a própria vida; e o de peças de automóveis, porque coloca a vida do motorista e de todos os demais que andam nas ruas.