Em meio à discussão do processo de impeachment, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse que o país enfrenta um problema de "falta de alternativa" e comentou em tom crítico a possibilidade de o PMDB assumir o poder. As afirmações foram feitas em um encontro com estudantes nesta quinta-feira.
– Quando, anteontem, o jornal exibia que o PMDB desembarcou do governo e mostrava as pessoas que erguiam as mãos, eu olhei e pensei: Meu Deus do céu! Essa é a nossa alternativa de poder. Eu não vou fulanizar, mas quem viu a foto sabe do que estou falando – disse o ministro, em conversa no Tribunal com alunos da Fundação Lemann.
A foto do momento em que é selado o desembarque do PMDB do governo tem como figuras principais o ex-ministro Eliseu Padilha – um dos peemedebistas mais próximos do vice-presidente Michel Temer –, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o primeiro-vice-presidente do PMDB, senador Romero Jucá (RR).
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Na conversa com alunos, Barroso afirmou que o problema do país é a "falta de alternativa" na política.
– Não tem para onde correr. Isso é um desastre – afirmou.
O ministro não sabia, ao fazer os comentários, que o encontro estava sendo transmitido pelo sistema interno de TV do Supremo, ao qual todos os gabinetes do Tribunal têm acesso. Após as críticas, Barroso foi informado de que a conversa estava sendo exibida e pediu para que os áudios fossem excluídos. O ministro também fez comentários sobre o sistema político.
– A política morreu, porque nós temos um sistema político que não tem um mínimo de legitimidade democrática, ele deu uma centralidade imensa ao dinheiro e à necessidade de financiamento e se tornou um espaço de corrupção generalizada – disse o ministro. – Talvez morreu eu tenha exagerado. Mas ela está claramente enferma. É preciso mudar.
Crítico do sistema eleitoral do país, Barroso disse que há um distanciamento entre eleitores e eleitos.
– É um sistema em que o eleitor não tem de quem cobrar e o eleito não tem a quem prestar contas, não pode funcionar – disse, ao falar sobre a eleição por voto proporcional.
Foro
Mais cedo, em palestra a universitários do Centro Universitário de Brasília (UniCeub), Barroso fez críticas ao chamado "foro privilegiado".
– É um desastre para o país e é um mal para o Supremo. O foro por prerrogativa de função deveria alcançar o presidente da República, o vice-presidente da República, os presidentes de Poder e mais quase ninguém – disse o ministro.
Ele defendeu, conforme já fez em momentos anteriores, a criação de uma vara especializada em Brasília para cuidar dos processos criminais de autoridades que hoje possuem foro perante o STF e perante o Superior Tribunal de Justiça. Atualmente, além dos presidentes de Poder e presidente e vice-presidente da República, uma série de outras autoridades possui a prerrogativa de só ser investigada e processada na área penal pelo Supremo, como deputados, senadores e ministros de Estado.
Barroso afirmou ainda que o modelo de foro privilegiado amplo "estimula a fraude à jurisdição", citando como exemplo, de forma genérica, casos em que parlamentares renunciam para escapar do julgamento no STF. Dentro das próximas semanas, o Supremo terá de julgar a situação do foro do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, ao ser empossado ministro-chefe da Casa Civil, teria suas investigações remetidas ao STF.
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, no entanto, enviou parecer à Corte no qual pede a manutenção da posse de Lula, mas a continuidade das investigações na Justiça de primeira instância, para evitar efeitos prejudiciais do que chama de "desvio de finalidade" na nomeação do petista.
O ministro também afirmou que o processo de impeachment é um "momento dramático" para o país, independentemente do resultado final, mas defendeu a tolerância nas discussões.
– As pessoas deveriam debater ideias sem compulsão de desqualificar as opiniões dos outros. Não precisa dizer que quem pensa diferente é mal-intencionado. (...) Um choque civilizatório no debate público brasileiro faria muito bem a todos – disse Barroso.