A incerteza de quando o isolamento social irá chegar ao fim tem elevado os níveis de ansiedade. A luta contra o coronavírus e as informações - como a confirmação de novos casos e mortes pelo mundo - acentuam o quadro de insegurança. Por isso, é preciso que cada um, em sua casa, consiga administrar bem a mente para que a chamada quarentena não se torne um caminho espinhoso.
— A ansiedade é uma reação que nos mantém ligados à realidade, precisamos senti-la diante dos fatos da vida. Mas ela pode ser do tipo generalizada, que nos atrapalha, e pode ser uma que nos protege, para nos sentirmos bem diante de algo iminente. Se for em uma intensidade muito grande, ela pode se transformar em angústia. A partir disso, a pessoa fica atrapalhada, potencializando a realidade com pensamentos e até tendo sensações no corpo — explica o psicanalista Roberto Ossig de Vasconcelos, especialista em psicoterapia.
Desviar o pensamento para outros assuntos é uma das armas mais importantes nessa luta mental. Para o psiquiatra Nelson Asnis, professor da PUCRS e presidente da Fundação Universitária Mário Martins (FUMM), a pessoa precisa ter uma rotina saudável, que ajude a equilibrar as obrigações - tanto profissionais como da casa.
Abaixo, confira - em 10 pontos - as dicas dos dois entrevistados por GaúchaZH:
1 - Estabelecer rotina
Mesmo trabalhando em casa, é preciso manter hábitos e estabelecer horários para todas as atividades. De acordo com Asnis, o período de isolamento social pede que a mente se organize também, planificar bem as ações ao longo de todo o dia.
2 - Fazer uma boa leitura, escutar música e cozinhar
Tanto Asnis como Vasconcelos acreditam que distrações culturais são fundamentais nesse período. Livros atrasados, há um bom tempo aguardando para serem lidos, e até tentar fazer uma receita nova são muito bem-vindos nesse período.
— Se envolver com práticas dentro de casa podem ser prazeroso, como uma boa receita e fazer uma comida que tinha vontade de fazer, quando não tinha tempo antes — exemplifica Vasconcelos.
3 - Evitar o excesso de notícias e eleger fontes confiáveis
O isolamento social - e o seu fim ou continuidade - depende da evolução do novo coronavírus e, com isso, acompanhar o noticiário o dia todo pode ser péssimo para a ansiedade. Vasconcelos acredita que o excesso de informações durante o dia pode ser "tóxico" e, para driblar isso, sugere que se eleja algumas fontes para se manter atualizado:
— Existem fontes não-confiáveis que proliferam dor, angústia e deixam tudo mais caótico. Por isso, é importante escolher jornais e meios confiáveis, poucos, para ficar ligado. Mas que não se fique o tempo todo ligado, isso é insuportável para mente e espírito.
Asnis concorda com a ideia de se evitar os excessos com o noticiário e vai além: estipular, no máximo, duas ou três horas por dia para se informar.
— Uma hora pela manhã e outra pela tarde. Assim, você não fica alienado e também sem receber informação. De preferência, é melhor não ler notícias antes de dormir, porque isso pode afetar qualidade do sono — frisa o psiquiatra.
4 - Manter contato com amigos e família
Neste momento, é importante se manter em contato com outras pessoas que estão vivendo na mesma circunstância. Quem mora sozinho, precisa buscar familiares e amigos, fazendo chamadas em vídeo. O mesmo vale para as pessoas de idade, que precisam do distanciamento social, mas que devem ser contatados sempre que possível. Asnis indica que os idosos aprendam a mexer no WhatsApp, facilitando a comunicação:
— Nem que eles peçam para um filho ou neto explicar só o básico, como iniciar uma chamada em vídeo. Deve-se manter a pessoa dentro dessas rotinas familiares, com contato visual, como filmando os netos brincando, por exemplo. Isso já vai ajudar e muito.
5 - Realizar atividades físicas
Mantendo o corpo em movimento, o organismo corre menos riscos de produzir substâncias comuns do excesso de ansiedade. O cortisol, por exemplo, é aliado ao estresse e pode atingir níveis altos sem esportes.
— Quanto mais estresse tiver, mais a imunidade será atacada — reforça Vasconcelos. — Atividade física em casa exige criatividade, mas é fundamental. Alongamentos e até caminhar várias vezes pela casa ajuda. Essa movimentação via produzir endorfina que combate estresse.
6 - Testar a capacidade de estar só se alimentando de memórias antigas
Se voltar para dentro e encontrar boas memórias faz bem. Alimentar a mente com momentos inesquecíveis com pessoas que gostamos é uma boa indicação.
— Rever fotos com familiares em festas e recordar bons momentos, até em vídeos de celular, também são bons remédios contra a ansiedade. Dá para melhorar a autoestima e dificultar o estado depressivo — destaca Vasconcelos.
7 - Fazer planos futuros
Asnis concorda com a ideia de Vasconcelos - de que visitar antigos eventos pode ser benéfico - e complementa: é preciso continuar planejando viagens, festas e eventos futuros.
— O mais importante é saber que tudo isso vai passar. Agora pode ser uma boa hora para pensar e organizar uma boa viagem. Assim que tudo normalizar, já ir fechando pacotes e realizar as reservas necessárias. Não podemos esquecer que vamos ter um futuro adiante.
8 - Cuidar da higiene do sono
Como o aumento da ansiedade tem relação com as horas de sono, é preciso ficar atento com a qualidade no período em que se está dormindo. Asnis reforça a importância da higiene do sono: preparar o corpo antes de deitar.
Esse processo deve começar, pelo menos, de duas a três horas antes de descansar. Ouvir música, um programa leve, ler algo e tomar um banho quente são algumas das indicações do que fazer antes de ir para a cama. Evitar se atualizar com notícias nesse período.
9 - Manter hobbies - mesmo que sejam externos (com adaptações)
Aquilo que é uma paixão não pode ser cortado totalmente. Anis exemplifica alguém que é apaixonado por futebol: mesmo sem poder sair de casa, essa pessoa deve manter hábitos, seguir atenta aos programas especializados, rever antigas partidas.
— Não é a mesma coisa, é claro, mas manter o hobby e preservá-lo minimante vai ajudar a controlar a ansiedade — acredita Asnis.
10 - Fazer terapia
Por ser um grande cenário de incerteza, os dois profissionais destacam a importância de se ter um acompanhamento psicológico. Uma simples sessão de terapia funciona como um "tranquilizante", segundo Vasconcelos.
— É muito importante que, quem já fazia, mantenha as sessões mesmo online. E quem começar a se sentir irritado e perceber que tem muitas horas de sono, indícios de ansiedade, devem procurar ajuda — finaliza Asnis.
A dupla indica, inclusive, o trabalho da Fundação Mário Martins, que está oferecendo gratuitamente o serviço de profissionais da saúde à comunidade. Mais informações pelo (51) 98585-0120.