O Comitê Olímpico do Brasil (COB) está otimista para os Jogos Olímpicos de Paris 2024. Em conversa com GZH, Ney Wilson, diretor de Alto Rendimento do COB, diz acreditar que o país superará o recorde de 21 medalhas de Tóquio 2021, quando ficou em 12º no quadro geral.
As Olimpíadas começam daqui cinco meses e a contagem regressiva está cada vez mais acelerada. A capital francesa deverá receber cerca de 10,5 mil atletas, sendo 330 brasileiros. Até o momento, o Time Brasil tem 156 vagas já garantidas em 28 modalidades.
— A gente trabalha sim, com a projeção de evoluir no número de modalidades que cheguem à medalha olímpica. Temos algumas com a expectativa de conquistar seu primeiro pódio, como tiro com arco, canoagem slalom e ginástica rítmica — avalia Ney Wilson.
Na entrevista abaixo, Ney também abordou questões de logística e temas como a disputa pelo poder no skate, entre Confederação Brasileira de Skate (CBSK) e Confederação Brasileira de Hóquei e Patins (CBHP) e a decisão de Filipe Toledo em não disputar a temporada 2024 do Circuito Mundial de surfe.
Em qual estágio está a preparação brasileira para os Jogos de Paris?
A gente começou a Missão Paris em 2019, um ano antes da data programada dos Jogos de Tóquio, adiados pela pandemia de covid para 2021. A Missão começou com visitas, identificação de espaços, mas claro que a relevância vai aumentando à medida em que a data da abertura vai se aproximando. Esse é um momento extremamente importante para a classificação olímpica, seja direta ou por ranking para a maior parte das modalidades. Em algumas delas, a classificação se encerra só um mês antes dos Jogos. E ainda temos alguns campeonatos mundiais. Cada modalidade tem suas especificidades e características.
Qual o foco do COB nesse momento?
Nosso olhar hoje está no desempenho esportivo, com os detalhamentos para que a gente possa dar a cada confederação, a cada treinador, em termos de suporte, algo que possa fazer uma diferença grande. Afinal, estes detalhes são fundamentais. Também focamos na área de Jogos e Operações Internacionais, bastante importante por ser responsável pelo acolhimento da nossa delegação em Paris. Toda logística e o material que vai sair do Brasil. A chegada de um barco, dos cavalos, munição, arma. É bem complexo e precisamos entender isso muito bem com os atletas e as confederações. Os atletas usam barco até o último dia, mas tem data certa para chegar. Seja a canoa do Isaquias (Queiroz), o barco a remo do Lucas (Verthein), o barco a vela da Martine (Grael) e da Kahena (Kunze). A preparação do material esportivo que vem da China, precisa de uma estrutura para montar as malas. Temos todo o nosso prédio (na Vila Olímpica), que tem de estar adequado às nossas necessidades. E ai temos uma série de encontros com as áreas médica, de psicologia, análise de desempenho e biomecânica. Enfim, todas as que precisam estar próximas aos atletas e treinadores para que a gente dê suporte e monte nosso prédio dentro da Vila Olímpica.
Los Angeles 2028 já começou?
Já tivemos uma visita a Los Angeles, uma vistoria. Já contratamos um consultor local e avançamos com reuniões focando o projeto de 2028. E adianto que esse ano ainda vamos à Austrália para dar início ao projeto de Brisbane 2032.
O que é mais difícil de lidar? Com o que está ao alcance do COB, em termos de auxílio de projetos, que exige trabalho minucioso ou questões extras com atletas e confederações?
A nossa equipe tem de se preparar da mesma forma que um atleta. Precisamos estar muito bem preparados para recebê-los para entender as imprevisibilidades que acontecem no alto rendimento. Seja uma lesão de atleta, desfalque de um time, ou uma medalha que contamos e não vai chegar. Agora, por exemplo, tivemos a eliminação do futebol masculino, que tem histórico positivo de medalhas. Não temos controle, é a CBF que monta o time. Mas precisamos ter isso em conta.
Como vocês trabalham com potenciais medalhistas neste momento?
Nós temos três níveis de provas e modalidades. O número 1 é o máximo, de atletas que estão muito próximos da medalha e são candidatos. Alguns que com histórico e outros que, pelo ciclo, têm potencial muito grande. Nosso olhar é voltado a essas modalidades, com equipes multidisciplinares monitorando tudo para saber passo a passo e não avançar sinais.
Como este processo é organizado?
O judô tem o exemplo da Mayra Aguiar, que vai a competições pontualmente. Isso é estratégico, ela é uma atleta muito experiente. E somos muito assertivos. Quando ela tem chegado ao pódio, isso é uma construção a muitas mãos. Para que a gente corra o mínimo de risco de lesão e o atleta esteja no ápice dentro da Olimpíada. Eles podem chegar lá e não ganhar medalha, mas devem obter seu melhor desempenho até então. É a nossa busca, para que cada um represente sua modalidade com a melhor performance. Esse olhar sobre o que temos maior segurança, com o monitoramento dos profissionais é onde atuamos muito efetivamente, já que os pequenos detalhes fazem muita diferença. É identificar um atleta que está atingindo um nível de treinamento ou competição em que ele está saindo da curva e, perto de uma lesão, nós temos que tirar o pé do acelerador e alertar o treinador.
No skate, a disputa entre Confederação Brasileira de Skate (CBSK) e Confederação Brasileira de Hóquei e Patins (CBHP) preocupou o COB em relação aos atletas?
Nosso papel em situações como essa, que fogem ao nosso controle, é (COB) ficarmos como gestores da modalidade. Nossa primeira medida foi uma aproximação com os atletas para dizer a eles que tudo que foi planejado até os Jogos Olímpicos não vai faltar. Nessa reunião, pedimos a eles outras necessidades que eles tinham e pudessem nos passar. Estavam presentes atletas, treinadores e agentes (empresários). Foi importante para entendermos melhor a modalidade. Nós lidamos com todas, mas não temos especialização nelas. Isso fica a cargo da confederações. Foi um avanço para gerar tranquilidade e entendermos que os atletas estavam se encaminhando para um lado muito político. Eles são importantes, vozes fundamentais, mas precisam ter a tranquilidade para treinar e competir. É uma modalidade que ainda tem a classificação olímpica. São três eventos, o primeiro em Dubai. Serão 50 atletas e todos com as taxas pagas pelo COB. Até hoje, eles eram responsáveis pelas despesas, mas nós entendemos que, por se tratar de classificação olímpica, a responsabilidade é toda nossa. Eles entenderam e já ficaram bem mais tranquilos.
Filipe Toledo anunciou que não vai competir no circuito mundial de surfe esse ano. Isso preocupou o COB de alguma forma?
Ele já tinha conversado (conosco), que iria se afastar. Mas disse que queria se concentrar nos Jogos Olímpicos, que iria se dedicar profundamente. Quando ele informou ao público, nós já sabíamos disso e estávamos alinhados. Agora, ele vai disputar o ISA Games e é importante para ter mais uma vaga para o Brasil. Ele está lá com o Gabriel Medina e com o Yago Dora. Todos de alto nível, que podem ser campeões e nos dar mais uma vaga olímpica.
O local de competição do surfe será no Taiti e você já esteve lá junto com os atletas. O que é possível falar sobre o que foi preparado em um lugar distante da França e da Europa?
Não só não é na Europa, como é muito longe. A Polinésia Francesa é do outro lado do mundo, eu diria que é no meio do nada. Estive lá no passado. É uma prova difícil, mar diferente, assim como o Havaí. Os brasileiros dizem que é o "Maracanã do surfe", é um lugar que eles gostam de estar. Tem um significado muito importante para eles. Nós entendemos o que eles estavam habituados e tentamos não descaracterizar isso no contexto olímpico. Buscamos um local muito próximo do mar. Porque eles gostam de enxergá-lo, ver a formação das ondas, o vento, detalhes da natureza. Nós buscamos esse espaço apresentado por eles e o contratamos. É uma pousada que fica a 500 metros do mar e atende o que eles desejam. É exclusivo. Nós não vamos ficar onde o Comitê Organizador vai oferecer, já que ainda não definiram como fazer. Primeiro, iriam reativar um hotel. Depois, colocaram como opção de todos os atletas ficarem em um navio que ficaria aportado lá.
O que vai ser oferecido aos atletas no Taiti?
Já testamos essas instalações. Vamos ter comida brasileira, levamos um chefe para orientar as cozinheiras locais sobre tempero e como fazer um feijão. Os atletas do surfe estão habituados a correr o circuito mundial, onde cada um vai por si. Nós (COB) levamos o contexto olímpico como equipe, montamos estrutura para trabalhar fisicamente dentro da pousada. Fizemos os ajustes necessários. Conversamos com eles (atletas) e com os treinadores. Está tudo alinhado para que eles cheguem lá e façam uma grande competição, com grande performance.
Qual é sua projeção para Paris? O que se pode dizer sobre número de medalhas?
A gente trabalha sim, com a projeção de evoluir no número de modalidades que cheguem à medalha olímpica. Temos algumas com a expectativa de conquistar seu primeiro pódio, como tiro com arco, canoagem slalom e ginástica rítmica. Estão muito próximas, até pelo que fizeram no ciclo olímpico, ranking, e os mundiais. Isso gera essa possibilidade, o que é um avanço. Fizemos uma projeção conservadora no número de medalhas, mas acreditamos que possamos superar. É muito difícil fazer prognóstico da quantidade ou do número de ouros, pratas e bronzes, até por estarmos no processo de classificação e não sabermos quem serão os atletas, provas e modalidades que teremos classificação. Mas temos perspectivas de melhora (do número) de finais. Nós vemos que estamos avançando e nos preparando bem para chegar ao objetivo de superar. Mas esse progresso é muito cobrado, cada avanço de uma medalha a mais é um esforço gigantesco. São muitas variáveis que nós não controlamos, como o futebol masculino não classificar. Era uma medalha que estávamos computando e agora não mais. Ainda temos de 4 a 5 meses até os Jogos e acredito que vamos construir e consolidar essa ideia de superar os resultados anteriores.