Se adaptar algumas funções, é possível dizer que tem um time inteiro de capitães no atual grupo colorado. Dos 33 jogadores que integram a equipe, 11 usaram a braçadeira em algum momento da carreira, no Inter ou em outro clube ou seleção. Essa experiência é uma das armas para a semifinal da Libertadores, diante do Fluminense.
Rochet; Mallo, Mercado, Gabriel e Renê; Campanharo, Aránguiz, Bruno Henrique e Alan Patrick; Valencia e Luiz Adriano. Na comissão técnica, Eduardo Coudet e Lucho González. Nos gabinetes, Magrão. Todos foram capitães. Eles sabem a importância que essa liderança exerce sobre os companheiros e também sobre os adversários.
A braçadeira não é apenas uma obrigação que o time precisa cumprir, apontar alguém que represente os outros. Ser capitão significa controlar o que for possível no vestiário, negociar com dirigentes, argumentar com a comissão técnica, cobrar e acolher companheiros. E, no campo, ser o porta-voz. É uma função tão importante que em países como Itália e França, por exemplo, a escolha se dá em votação fechada no vestiário.
A ciência também ajuda a explicar essa importância. As psicólogas Fernanda Larruscaim e Rafaella dos Santos Kochenborger estudaram o papel do capitão durante as partidas de futebol, em um trabalho realizado na PUC-RS. Observando partidas em Porto Alegre, descreveram as ações desses jogadores. Rafaella diz:
— Os capitães, além de líderes formais, eram também porta-vozes dos times. Quando necessário, eram eles que conversavam com o árbitro, com os assistentes e até mesmo com jogadores do time adversário. Em momentos de conflitos e tensão, batiam palma, possivelmente para aumentar o foco e a confiança do time, transformando momentos de conflito em incentivo.
Um time com tantos líderes é um dos diferenciais do Inter para ter chegado à semifinal da Libertadores em 2023. Essa opinião foi emitida por um especialista. De tanta ascendência com os companheiros, Bolívar ganhou um apelido que vai além de ser capitão: General. Dono da braçadeira na Libertadores de 2010 e na Recopa de 2011, fez parte de outros grupos lotados de personalidades. No super Inter de 2006, do qual era integrante, foram capitães Clemer, Ceará, Edinho, Tinga, Iarley e, claro, Fernandão. Em 2010, a lista tinha Rafael Sobis (que ainda não havia usado a faixa em 2006), Nei e D'Alessandro. Por isso, Bolívar fala com autoridade:
— É fundamental ter tantos líderes. O Inter estava carente disso no primeiro semestre. O futebol precisa ter jogadores que organizam em campo, para as vezes que não é possível ouvir o treinador, em um estádio lotado. Jogadores assim não se inibem de cobrar o companheiro porque todos sabem que é para o melhor. É uma grande diferença na evolução do time no ano.
Outra autoridade em termos de capitania colorada é Elías Figueroa. Capitão nos dois primeiros títulos nacionais, teve o posto eternizado na narração de Armindo Antônio Ranzolin ("O capitão Elías Figueroa, de cabeça, cumprimentou Raul!"). E era o líder de um vestiário cheio de cobras criadas: Manga, Cláudio, Marinho Peres (então capitão da Seleção), Falcão, Carpegiani e Valdomiro, por exemplo.
— É muito bom ter tantos líderes, ainda mais quando podem dividir essa função. Quando trabalham para o bem do time, ajuda muito — comenta o chileno, um dos maiores jogadores da história da América do Sul.
Uma situação que poderia causar problema em ter tantos líderes no mesmo ambiente não preocupa Bolívar. Com tantos chefes, poderia ter "poucos empregados". Mas o capitão de 2010 não enxerga isso até o momento:
— Esses jogadores do grupo colorado têm carreira construída, foram capitães e sabem a importância da solidariedade, de deixar a vaidade do lado. Os jogos do Inter mostram isso.
No Maracanã lotado, eles serão fundamentais, em campo ou fora, para manter a tranquilidade do time. E depois, com o resultado que for obtido no Rio, buscar a classificação em casa. Por falta de casca e por falta de braçadeira, o Inter não deverá sofrer. Poderá se preocupar apenas em jogar contra o Fluminense.
Os capitães
ALAN PATRICK
Virou capitão com Mano Menezes no início de 2023. O camisa 10 tem uma ascendência técnica, além de moral com os companheiros. Não é do perfil gritão, pelo contrário, pede mais atitude em campo do que nas palavras. Um exemplo é seu discurso no vestiário, antes de enfrentar o Bolívar. No vídeo dos bastidores da vitória, produzido pelo Inter, ele diz:
— Precisamos muito mais do que ficar gritando aqui, hein! Vamos ter atitude em campo, ter atenção em todos os detalhes.
ROCHET
Era tão capitão, mas tão capitão no Nacional-URU que os uruguaios repatriaram ninguém menos do que Luis Suárez no ano passado e a braçadeira seguiu no braço do goleiro. A despedida do Nacional nas redes deixa claro o recado: "Nos ensinou uma das mais agradáveis lições sobre liderança, humildade, talento e amor ao Nacional. Até a volta, capitão".
MALLO
Foram 14 anos no Celta de Vigo. Praticamente a carreira inteira. É o terceiro atleta que mais vezes vestiu a camisa da equipe, com 443 aparições, superado apenas por Iago Aspas e Manolo. Dos 443 jogos, foi capitão em mais da metade. No jogo de número 250 com a faixa, foi homenageado pelo clube.
GABRIEL
Chegou ao Beira-Rio com fama da liderança exercida nos tempos de Corinthians. Se não era brilhante tecnicamente, compensava em energia, entrega e força. No Inter, logo essas características apareceram. Após um dos grandes vexames da história colorada, a derrota para o Globo na Copa do Brasil, foi ele, mesmo estando há pouco mais de um mês, quem botou as caras para dar uma entrevista coletiva obviamente constrangido. Virou capitão ainda em 2022. Depois, quando se lesionou, seguiu frequentando o vestiário em dias de jogos, inclusive fazendo o discurso motivacional.
MERCADO
A experiência de representar a Argentina na Copa do Mundo e no Mundial Sub-20, as conquistas sul-americanas com o River Plate e a passagem pelo Sevilla (onde também foi capitão) colocam Mercado na hierarquia da braçadeira no Inter. O zagueiro é uma liderança do vestiário e também na hora de falar com a arbitragem, especialmente em jogos da Libertadores.
RENÊ
Na despedida de D'Alessandro, no início do Brasileirão de 2022, o lateral recebeu um recado do argentino: "Está há pouco tempo, mas puxa essa barca aí".
Divide com Mercado e Luiz Adriano o posto de vice-capitão, logo atrás de Alan Patrick. É um líder do vestiário.
VALENCIA
É mais um caso de ascendência por questões técnicas. No Inter, por ter chegado há pouco, ainda não vestiu a braçadeira. Mas é o capitão da seleção equatoriana, maior ídolo do futebol do país, dono do vestiário em seu país natal, a ponto de ter um repórter em Porto Alegre em sua apresentação só para perguntá-lo sobre a capitania.
ARÁNGUIZ
Aí está um caso curioso. Aránguiz nunca foi capitão no Inter nem na seleção chilena (que teve Bravo, Alexis Sánchez, Vidal e Medel em sua geração). Tem um estilo calado, discreto. Mas na Alemanha, com a dificuldade do idioma, usou a tarja no Bayer Leverkusen. Na época, mencionou que precisava ser mais falante a partir dessa responsabilidade.
BRUNO HENRIQUE
Não é fácil ser capitão em clubes rivais. Bruno Henrique conseguiu essa proeza: usou a faixa em Palmeiras e Corinthians, inclusive levantando troféus. E segue respeitado em ambos os clubes. É um candidato natural a capitão colorado na próxima temporada, quando já terá mais tempo de Beira-Rio.
LUIZ ADRIANO
Foi capitão já na última partida, quando Alan Patrick, Mercado e Renê não estavam. Mas mesmo com os dois últimos em campo, é candidato a portar a braçadeira. O tempo de casa e o título mundial são importantes, assim como a identificação. Foi capitão também no Shakhtar.
CAMPANHARO
É um dos casos curiosos. Mesmo que tenha perdido espaço, Campanharo segue como uma liderança do Inter. É possível vê-lo nos vídeos passando confiança, incentivando os colegas e mostrando sua ascensão. A experiência de capitão foi na Chapecoense, clube em que foi um dos maiores destaques.