O Inter enfrenta o Bolívar nesta terça-feira (22), em La Paz, a 3,6 mil metros acima do nível do mar, pelo jogo de ida das quartas de final da Libertadores. E para entender na prática quais as dificuldades que os jogadores colorados vão enfrentar na altitude, a reportagem de GZH foi até o Laboratório de Performance em Ambiente Simulado do Departamento de Desportos Coletivos do Centro de Educação Física da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
O local, inaugurado em 2015, dispõe de dois equipamentos que simulam os efeitos da altitude. Um deles é uma espécie de câmara em que todo o ambiente recebe o ar mais rarefeito. No entanto, esse está em manutenção. Em outro, um sistema com uma máscara libera o ar com menos quantidade de oxigênio.
O professor Luiz Osório Cruz Portela foi quem coordenou o experimento. Doutor em Ciências do Esporte pela Universidade de Hannover, estuda há 20 anos o tema da avaliação da capacidade física em hipoxia (que é a diminuição do aporte de oxigênio nos tecidos). O acadêmico de Educação Física Fábio Brondani Dotto, 22 anos, também atleta do handebol da UFSM, foi voluntário na simulação.
Primeiro o teste é feito em ambiente normal. Começou com o atleta parado, apresentando 68 batimentos por minuto e 99% de saturação de oxigênio no sangue. Em uma simples caminhada, os batimentos ficaram na média de 115 e a saturação praticamente não se alterou. Ao aumentar para uma corrida leve (9km/h), os batimentos subiram para 155, mas a saturação continuou inalterada.
Após um tempo para repouso, Fábio colocou a máscara de simulação de altitude regulada para 3,6 mil metros. Mesmo parado, os batimentos foram para 112 e a saturação caiu para 92%. Ao caminhar, os batimentos variaram entre 125 e 137 e a saturação chegou a 77%. Depois de mais um período de descanso, uma leve corrida elevou os batimentos para 180 e saturação de oxigênio variando de 70% a 75%.
É muita diferença. Durante a corrida dá para perceber a questão da respiração aumentando. Dá meio que uma sensação de desespero, não vinha o ar basicamente
FÁBIO DOTTO
Acadêmico que fez o teste
Durante o teste, foi possível notar mudanças nas expressões de esforço e até mesmo na fisionomia do voluntário. Já exposto há mais tempo ao ar mais rarefeito, a cor da pele foi ficando mais pálida. Conforme explica o professor Osório, isso se deve pelo fato de o organismo diminuir a circulação sanguínea das extremidades, como a pele e os dedos, e destinar a órgãos e músculos mais importantes.
— É muita diferença. Durante a corrida dá para perceber a questão da respiração aumentando. Dá meio que uma sensação de desespero, não vinha o ar basicamente — relata o estudante.
O professor explica que a queda de oxigenação no sangue é o principal problema. Com a capacidade respiratória reduzida por conta da diminuição de oxigênio no ar, falta oxigênio e o desempenho físico cai.
— A queda do consumo de oxigênio é a variável que mais afeta o desempenho. A disponibilidade de oxigênio dentro do corpo cai muito. De valor normais de 98%, mesmo em velocidade e intensidade muito baixas, chegamos a constatar 70% de saturação. Baixa o rendimento e não há o que fazer — destaca Luiz Osório Cruz Portela.
O professor também reforça que, quanto maior a exposição à altitude, maiores os efeitos no corpo. Por isso, de certa forma, a estratégia dos clubes de chegar apenas no dia do jogo pode ser positiva. No entanto, se a chegada fosse três dias antes, o organismo já estaria mais adaptado.
— A adaptação visa superar esses problemas pelas alterações corporais que são adquiridas pelo corpo. Muda uma série de variedades fisiológicas que proporcionam um melhor desempenho. A estratégia feita pela maioria dos clubes é de permanecer o mínimo possível, porque à medida que aumenta as horas de permanência, os sintomas tendem a piorar. Se fala que três dias é muito pouco, mas prefiro três dias do que duas horas antes. Então depende do método, da adaptação anterior e da sensibilidade que as pessoas têm. Já peguei pessoas em testes que têm uma resistência maior à hipoxia e que nunca tiveram em altitude. Isso é genético da pessoa — diz.
Osório já esteve com clubes em situações de altitude. Foram duas vezes em La Paz, com o Corinthians e com o Goiás. Em Potosí, também na Bolívia, a mais de 4 mil metros, com o Flamengo. E, em 2002, o professor fez um trabalho de adaptação com o Grêmio, quando o Tricolor enfrentou o Cienciano, em Cuzco, no Peru, a 3,4 mil metros de altitude.